sexta-feira, maio 25, 2012

As Coroações da Política


Com o aproximar do horizonte das próximas eleições regionais – conquanto estejamos mesmo ainda formalmente longe dos calendários oficiais para a respetiva pré-campanha –, é cada vez mais notório o posicionamento estratégico dos partidos políticos para esse embate que se afigura difícil e incerto para todos os principais intervenientes…

– E todavia, apesar de algumas sondagens ou auscultações (que estão, umas, na reserva dos gabinetes e, outras, nas páginas eletrónicas de muitos jornais e redes sociais) serem, como é sabido e na maioria dos casos, de autenticidade, metodologia e rigor mais do que duvidosos, manipuláveis ou lacunares, a verdade é que a elas ninguém, no pleno e desejável uso das suas capacidades políticas e no exigível desempenho das suas responsabilidades partidárias, deveria continuar a permanecer tão indiferente, ou desatento, como às vezes parece!

De resto e por isso mesmo, é que todo e qualquer passo de dança em corda bamba (e sem rede, ainda por cima, ou por baixo!) de gestos e linguagens, no atropelo de regras ou em incauta displicência, por muito que custe ouvir agora, ainda mais poderá vir a custar num futuro já não muito distante…

– E isto, como é evidente, aplica-se tanto ao único partido que sustenta o Governo Regional quanto aos vários que não o suportam, e que, antes pelo contrário, o que espreitam e ao que almejam é (re)assumir a governação do Arquipélago, em exclusivo, se possível, ou em coligação alternativa com quem mais lhes prometer ou estiver pronto a partilhar em pastas, carteiras e programas…

Ora é neste contexto que não deixará de ser útil nem despiciendo o tempo que se deveria prestar ao marketing político que já por aí corre, desde os pequenos mas bem conseguidos clips de vídeo musicado aos mais (des)mobilizadores, (des)motivadores ou (in)operantes outdoors, aonde tantas mensagens diversamente se afundam, ou elevam, na (des)qualificação dos meios humanos e iconográficos representados, e aos quais nem por obra e graça do Espírito Santo qualquer tipo de coroação irá redimir!
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Publicado em "Diário Insular" (Angra do Heroísmo, 26.05.2012),
"Diário dos Açores" (Ponta Delgada, 27.05.2012),

sábado, maio 19, 2012

Territórios de Risco



As últimas calamidade naturais, sinistros e decorrentes prejuízos que fustigaram o nosso Arquipélago não poderão deixar de continuar a suscitar e a merecer uma ampla e crítica reflexão objetiva, com vista à indeclinável e inadiável implementação de medidas práticas, apesar de alguns passos nesse sentido terem já sido dados, quer no âmbito do Governo Regional e das nossas Autarquias Locais, quer por parte dos diferentes partidos políticos da Oposição…

– Ora, apesar da violência e das características das tempestades que se abateram sobre as nossas ilhas na semana passada terem atingido dimensões imprevisíveis (?) e inusitadas, a verdade é que algumas das suas custosas consequências, ou ao menos parte delas – felizmente, desta feita, sem perdas de vidas humanas… –, talvez pudessem ter sido evitadas, ou sequer minoradas, caso tivessem sido cumpridas as leis, normas e procedimentos precaucionais que são imperativos nas áreas da governação, da administração e do acompanhamento técnico que, direta ou indiretamente, como em todo o lado, estão sempre implicados nestes domínios (que, como é sabido, envolvem logo e sobremaneira o Ambiente, o Ordenamento do Território, as Obras Públicas, a Agricultura e Florestas, o Saneamento Básico e a Proteção Civil…).

Por outro lado e bem intrinsecamente relacionada com esta exigente problemática, está toda uma vertente técnico-científica, reguladora, orientadora, pedagógica e fiscalizadora, institucional e socialmente, que entronca afinal e em cheio nas interdisciplinaridades próprias dos Estudos, Geografias, Cartografias e Gestão de Riscos, – territórios estes, há já demasiado tempo, esquecidos ou protelados, não promovidos nem devidamente fiscalizados, ou à sombra de muito do entulho e dos alheamentos, omissões, ignorâncias, incompetências, irresponsabilidades e impunidades que enxameiam alguns setores chave da nossa sociedade, com os seus agentes, atores e decisores apenas a fazer de conta que trabalham, enquanto vão contabilizando as pouco mais que mercenárias comissões de serviço para onde foram, imerecidamente, alcandorados, com evidentes e quase irreversíveis penalizações sistemáticas e recorrentes para a nossa Região, para o Governo dos Açores e para o próprio partido que também arriscadamente o suporta!
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Publicado em "Diário Insular" (Angra do Heroísmo, 19.05.2012),
"Diário dos Açores" (Ponta Delgada, 20.05.2012)

sexta-feira, maio 11, 2012

Os Labirintos da Sabedoria


Acaba de ser publicado (Círculo de Leitores/Temas e Debates, abril de 2012) um novo livro de José Mattoso, figura justa e sobejamente conhecida, respeitada e conceituada em todos os meios intelectuais, académicos, políticos, culturais e religiosos portugueses.

– Intitulada Levantar o Céu, a obra, dividida em duas partes (sintomaticamente enunciadas “Sabedoria e razão” e “Sabedoria e fé”), reúne quinze textos, “escritos [entre 1994 e 2011] ao sabor de solicitações variadas” e às quais o autor tentou responder segundo as suas “convicções pessoais”, sendo que desses temas uns são “mais ‘cívicos’, outros mais espirituais; uns inspirados no senso comum, outros na mensagem evangélica; uns recorrem à História, outros a princípios intemporais”.

Pretendendo assumidamente “contribuir em alguma coisa” para aquilo mesmo que o respetivo título indica e indicia – e que José Mattoso sugestivamente recolhe e retém tanto da denominação dada a um dos principais exercícios psicofísicos dos mestres de chi kung/tai chi, quanto “como metáfora de uma atitude de vida que dá a primazia ao Céu” (no sentido que esta palavra tem na cultura chinesa e na nossa) –, o livro, tal como também nas últimas entrevistas o historiador acrescidamente explicitou, documenta a sua filiação existencial e intelectual na mais luminosa e grande Tradição filosófica e teológica do Cristianismo, e num vasto e profundo horizonte englobante de ortopraxia espiritual e eticidade sapiencial, porém sem deixar, na mesma e implicada medida sistémica e sistemática (ontológica e cósmica), de percorrer e enfrentar – com um misto de ceticismo realista e de esperança redentora … – as cisões e as duras e decaídas realidades e contingências terrenas (morais, cívicas, sociopolíticas, ideológicas, ecológicas, culturais, etc.)!

– Ao ler este livro, cuja reflexão (casualmente no actual envolvimento do 13 de Maio em Fátima e das nossas Festas do Senhor Santo Cristo dos Milagres…) vivamente recomendo, não pude deixar de recordar, para além de toda a notável produção histórica, historiográfica, geo-antropológica e cultural do Prof. José Mattoso, o magnífico convívio e diálogo-debate que com ele mantivemos no Departamento Cultural do Colégio Universitário Pio XII, em Lisboa, nomeadamente sobre comummente admirados Pensamento, História e Arte Medievais (desde S. Tomás de Aquino até às mais controversas críticas nominalistas e contemporâneas de Umberto Eco…), sob a égide e o tão lúcido empenho, previdente e prospetivo labor histórico-cultural do nosso saudoso Padre Joaquim António de Aguiar, e aonde tantos dos idênticos temas e cruciais problemas, aqui ainda presentes, foram também então confluente e harmoniosamente aflorados, em linhas de vida sapiente e sabedoria vivida que continuam, hoje como sempre, exemplarmente testemunhadas e coerentemente consubstanciadas nesta, tal como em todas as outras suas obras, trabalhos, afetos, narrativas e preces…
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Publicado em “Diário Insular” (Angra do Heroísmo, 12.05.2012),
“Diário dos Açores” (Ponta Delgada, 13.05.2012),

sábado, maio 05, 2012

Amargos sinais de Maio


O 1º. de Maio deste ano – efeméride mundialmente consagrada à Comemoração do Trabalho e à evocação das históricas lutas e conquistas dos Povos da Terra em prol do universal reconhecimento da dignidade, dos direitos e dos deveres dos Trabalhadores –, ficou marcado entre nós, para além das habituais manifestações sindicais e de outras mais ou menos festivas animações de salão, praça ou rua, por três acontecimentos cujo simbolismo e conteúdo reais merecem registo; a saber:

1) Os sucessivos atos de puro vandalismo (mutilação, destruição, roubo e incêndio!) de que foi vítima uma Exposição de Maios tradicionais esmeradamente trabalhada pelos alunos e professores das turmas de Educação Tecnológica da Escola Jerónimo Emiliano de Andrade, numa cinta urbana de Angra do Heroísmo aliás já useira e vezeira em destemperos, despautérios e criminalidades que crescem e conspurcam cada noite que se abre nas imediações do Corpo Santo, EDA, DI, Avenidas e ditas “docas” e locas do Porto das Pipas, em zona para-turística da desamparada e desalmada urbe Património Mundial…

2) O espantoso e degradante cenário de quase saque a prateleiras de todos os tipos de produtos de uma cadeia de supermercados – conquanto bem concorrencial e promocionalmente vendidos a saldo, ou facultados à carenciada mas legítima e compreensível compra por pobres e médias bolsas e por conta de uns apelativos descontos de 50% –, naquilo que nacional, humilhante e pouco docemente pingou como que em traslados de miséria, pré-catástrofe socioeconómica, açambarcamento de aflições, penúrias e prenúncio de armazenamento de rações para antecipatórios medos de sítio ou cerco…

3) A divulgação de um muito atento e crítico documento (intitulado Desemprego e Confiança) da Comissão Nacional Justiça e Paz de Coimbra, onde são detetadas e denunciadas muitas das angustiantes feridas e sinais do tempo que vivemos (desemprego, violência, falta de confiança, solidão, perda da autoestima, insanidade mental, implosão e instabilidade da estrutura familiar, desinformação, agiotagem financeira, despesismo e injustiças sociais, instabilidade legislativa, legislação laboral inadequada, condicionantes e penalizações empresariais, morosidade judicial, deficientes fiscalizações, debilidade empresarial, desarticulação governamental e estratégica, etc.), – tudo isto contra o verdadeiro Bem Comum mas a favor e ao serviço da “manutenção de privilégios abjetos a uma ‘nomenklatura’ que, como sempre, situada na órbita ou dentro do poder político, se mantém incólume nos sacrifícios que são exigidos aos outros”, fazendo de Portugal um país anestesiado e adiado!

Ora todos estes fenómenos e indicadores, cada um ao seu nível de impacto e grau de gravidade local, regional e nacional, devem fundar outros tantos motivos de reflexão e um apelo também pessoal e ético a cada um dos nossos concidadãos, porquanto também e como, sem ilusões, retoma a CNJP da Carta Octogesima adveniens,  podem-se “alterar estruturas e criar novos métodos de gestão e decisão”, o que sendo “necessário nunca será suficiente, enquanto não percebermos o quanto as soluções dependem da conversão pessoal em mentalidade e nos comportamentos”. E assim então:

– “Seria bom que cada um procurasse examinar-se para ver o que é que já fez até agora e aquilo que deveria fazer. Não basta recordar os princípios, afirmar as intenções, fazer notar as injustiças gritantes e proferir denúncias proféticas; estas palavras ficarão sem efeito real se não forem acompanhadas, para cada um em particular, de uma tomada de consciência mais viva da sua própria responsabilidade e de uma ação efetiva. É por demais fácil alijar sobre os outros a responsabilidade das injustiças se se não dá conta, ao mesmo tempo, de como se tem parte nelas e de como a conversão pessoal é algo necessário, primeiro que tudo o mais”.
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Publicado em "Diário Insular" (Angra do Heroísmo, 05.05.2012); “Diário dos Açores” (Ponta Delgada, 05.05.2012);