sexta-feira, março 16, 2012

Memória do Grupo de Genebra



Lançado já em diversos locais do Continente e felizmente apresentado na passada sexta-feira, dia 16 de março, nos Açores (Ponta Delgada), o livro Pátria Utópica – O grupo de Genebra revisitado, da autoria conjunta de Ana Benavente, António Barreto, José Medeiros Ferreira e Valentim Alexandre é uma sugestiva rememoração histórica, pessoal e crítica da experiência de partida e regresso a Portugal dos seus autores, naquilo que neles e com eles (então jovens socialistas revolucionários) configurou um misto de exílio político e de experiência de emigração, resistência, reflexão e formação universitária, durante a sua permanência, nas décadas de 60 e 70, na Suiça, onde – entre outros projetos e ações – também mantiveram a revista “Polémica” (cujo primeiro número sairia em 21 de setembro de 1970 e que, nas palavras de Medeiros Ferreira era “Inovadora em termos de pensamento, representava uma esquerda democrática, cortou com as análises estabelecidas e teve influência, pois era distribuída e lida clandestinamente em Portugal”) …

– Organizado sob a forma de um espécie de recolha de depoimentos – que começaram a ser elaborados, em 2009, a partir de uma propiciatória revisitação induzida através da retoma de encontros, diálogos e discussões regulares entre todos eles, e da qual resultou a passagem a escrita narrativa dos respetivos percursos de “rebeldia e irreverência”, como os classificou Eduardo Lourenço numa das sessões de apresentação da obra –, Pátria Utópica permite-nos seguir os caminhos trilhados e hoje reperspetivados por cada um dos “exilados”, dando-nos assim e em simultâneo um quadro-síntese e paradigmático de alguns dos motivos, dramas e estigmas que balizavam a vida do nosso País e os horizontes individuais de grande parte da juventude portuguesa, em especial da classe estudantil universitária, politicamente comprometida e ativista, naqueles “tempos difíceis” da Ditadura.

Por outro lado, sendo a obra um repositório do passado da Pátria (ou, diga-se, de certo modo, de uma ideia ou ideal dela para nós, Portugueses…) – vistos atualmente, “depois de décadas de apagamento da memória histórica, [em que] é de difícil inteligência pelo comum dos mortais o mal-estar da juventude portuguesa nos anos 60”, nomeadamente com a “ameaça da mobilização para a guerra colonial [que] pairava como uma ave de mau auspício sobre os destinos individuais” –, contém ainda o mesmo livro uma excecional carga utópica e crítica (ou, diga-se novamente, também aqui, de certo modo uma crítica da própria utopia passada à luz da sua sombra nos desencantos do presente…), como aliás tem sido muito percetível e bem denunciado nas subsequentes leituras e debates que os próprios autores – especialmente os meus antigos camaradas e militantes no PS, Medeiros Ferreira (historiador), António Barreto (sociólogo) e Eurico Figueiredo (psiquiatra) – sobre a sua e afinal nossa Pátria Utópica tem sempre retomado, de um ou de outro modo…

– Todavia e curiosamente, dois dos membros do agora bem lembrado Grupo de Genebra mantiveram (e mantém ainda) com os Açores uma natural ou estreita relação, a que já me referi em anteriores ocasiões, mas cuja recordação, mais pessoal, no âmbito da nossa então comum pertença ao Partido Socialista hei de saudosamente tornar a evocar em futura crónica.
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Outra versão em "Diário Insular" (Angra do Heroísmo, 17.03.2012).
Publicado em "Diário dos Açores" (Ponta Delgada, 18.03.2012),