sábado, abril 07, 2012

Restauração e Resistência




J. H. Oliveira Marques, num texto conhecido, antes de salientar que “nacionalidade não implica necessariamente independência” e que a Restauração de 1640, se justificada pelo seu enquadramento nacional, carecia de ser explicada por grande número de outros fatores, elencou justamente de entre estes os seguintes:

– A necessária e natural articulação da individualidade cultural com a independência política; a conjuntura económica dos impérios português e espanhol; o posicionamento das classes, formações e grupos socioprofissionais e sociorreligiosos; as situações político-militares da Europa (aí incluídas as revoltas regionais da Biscaia e a rebelião nacionalista da Catalunha…) balizadas pelos sucessivos reposicionamentos estratégicos da França, da Holanda e da Inglaterra, a par e no contexto conflitual dos vários pontos de vista teórico-jurídicos e diplomáticos, por sua vez ainda situados no quadro militar puro e próprio de um processo revolucionário e de renacionalização como foi o que se seguiu à insurreição restauracionista portuguesa do século XVII…

E outro historiador (Joaquim Veríssimo Serrão), ainda propósito da mesma Restauração, não deixou de acentuar que ela representa “um período bem definido da história portuguesa”, que se impôs pela “unidade temporal que define uma grande realidade histórica”, tendo constituído uma retoma da “plena consciência do sentimento nacional”, pelo que assim deveria ser encarada na sua plena “unidade de pensamento e de ação”!

Ora perspetivando criticamente hoje qual o sentido que poderia ter para nós repensar os desafios de outras tantas e tão urgentes restaurações contemporâneas, e aquilo que no nosso desditoso País histórica e simetricamente se reproduz, ou aqui contraditoriamente se opõe na geografia mental, sociopolítica e patriótica do nosso Povo em alturas de crise com a que vivemos (mutação social, usurpação de direitos e de chamadas ao dever…) –, é de lamentar tudo o que se passou com o saneamento, agora abusivamente decretado em Lisboa, do feriado comemorativo da Restauração, já que o mesmo poderia ter continuado a ajudar a sinalizar muito dessa decisiva cultura de independência, de justa resistência e de solidária mobilização nacional…

– Mas não hão de faltar, por certo, outras ocasiões, desde a mais humilde freguesia às tribunas e ruas das maiores cidades, para um libertador reajuste dos símbolos, dos ideais e dos meios de regeneração comunitária, institucional e individual, no atual contexto de quase idênticas fatalidades, decadência e injusta submissão…
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Publicado em “Diário Insular” (Angra do Heroísmo, 06.04.2012),
“Diário dos Açores” (Ponta Delgada, 08.04.2012)