sábado, agosto 11, 2012

A Saúde da Nação


Embora algumas das principais abordagens até agora feitas na Comunicação Social e em certos fóruns partidários a propósito da Política de Saúde – com raras, previdentes e cautelares excepções individuais – tenham sido especialmente urdidas por força de meras argumentações tácticas, interesses conjunturais e tendenciosas, parcelares e obsessivas fixações em questões relativamente pontuais – ou apenas político-partidariamente usadas como recorrente arma de arremesso para-eleitoral –, não há dúvida que uma frontal, isenta e profunda reflexão crítica sobre esta e outras questões essenciais da nossa vida institucional e colectiva (como a Educação, a Cultura, o Trabalho e o Emprego, a Segurança Social, o Desenvolvimento Económico, o Controlo e o Equilíbrio Financeiro, a Democraticidade e a Transparência da Governação…) é cada vez mais necessária, urgente e prioritária!

Entretanto e ainda sobre a dita problemática da Saúde, novamente nos últimos dias, voltámos a assistir – e desta feita com grande destaque – na imprensa da capital, a impressivas e empolgantes notícias sobre aludidas e “catastróficas dívidas” regionais açorianas que, segundo as mesmas indistintas, pouco clarificadas e clarificantes fontes originais (e secundárias também…), teriam já atingido “montantes astronómicos”… 

E logo, como seria de esperar, o teor e as quantificações das referidas “denúncias” – na sequência aliás de outras identicamente tecidas no Arquipélago desde há algum tempo… – motivaram uma série de contraposições, cálculos alternativos e contra-fundamentações económico-financeiras, orçamentais e políticas…

– O problema, quer se queira quer não, é sério e complexo, pelo que merecia um corajoso levantamento e uma rigorosa resposta integrada, cujos perfis e contornos – enquanto os mesmos dizem integral respeito à mesma Política e Gestão da Saúde e dos respectivos sistemas e subsistemas – deveriam ir desde os financeiros e técnico-científicos aos da gestão administrativa e da formação profissional dos seus agentes, passando pelos, amiúde bem díspares, diferenciados, conflituais e até desmemoriados interesses corporativos, comerciais e deontológicos que neste terreno se digladiam (demasiadas vezes por cima dos bem sensíveis e reais corpos sociais e pessoais dos doentes e demais utentes dos serviços públicos e privados da Saúde …).

Porém, uma coisa seria a análise objectiva, serena e isenta de todas estas importantes e nucleares questões, e outra, bem diversa, é o aproveitamento e a distorção táctica das realidades quantitativas e qualitativas que também neste campo se entrecruzam, com intenções e fins de veracidade e interesse duvidosos para os Açores, para quem aqui governa e/ou pretende vir a governar (ou continuar a administrar) a nossa Região Autónoma! 

E depois, diga-se já, mesmo que de passagem apenas, que quem se mostra principalmente direccionado à destruição gradual, planeada e concertada do próprio Sistema Nacional de Saúde enquanto tal não parece muito vocacionado para a correcção das suas maleitas, desvios ou desvarios!

– Finalmente, quanto a certos OCS e a alguns infames políticos que pululam na choldra em que o País se tornou desde há muito, já sabemos do que gastam, reproduzem e vendem por lá e por cá, demasiadas vezes numa espécie de voyeurismo em marketing vicioso, impotente e irresponsável, que tanto desnuda e dá desrespeitosa e quase impúdica capa aos públicos e familiares factos e fatos de banho e toalhas do primeiro-ministro de Portugal e sua família, quanto oculta, omite ou falseia, sem dó nem piedade nem compostura solidária (ou apenas ética que fosse!) de qualquer espécie, os mais essenciais problemas, direitos, deveres, aspirações, medos, impasses e fragilidades dos nossos cidadãos e das suas vidas a arder ou imoladas nos altares do mais abjecto capitalismo neoliberal, financeiro, predatório e agiota que devora tudo e quase todos os povos e países do Globo!

A situação não é, infelizmente, nova, e já Eça, em 1871, testemunhava assim e do que via: 

O país perdeu a inteligência e a consciência moral. Os costumes estão dissolvidos, as consciências em debandada, os carácteres corrompidos. A prática da vida tem por única direcção a conveniência. Não há princípio que não seja desmentido. Não há instituição que não seja escarnecida. Ninguém se respeita. Não há nenhuma solidariedade entre os cidadãos. Ninguém crê na honestidade dos homens públicos. Alguns agiotas felizes exploram. A classe média abate-se progressivamente na imbecilidade e na inércia. O povo está na miséria. Os serviços públicos são abandonados a uma rotina dormente. O Estado é considerado na sua acção fiscal como um ladrão e tratado como um inimigo. A certeza deste rebaixamento invadiu todas as consciências”…

– E como haveria de ser de outro modo, ainda contemporaneamente, por parte de quem, externa e internamente, ao longo da História da Nação e da Autonomia, sempre nos tratou sob regimes de canga (ou “como se andássemos de tanga”…), e nos pretendeu institucional, material e simbolicamente submissos, incautamente alinhados ou politicamente coniventes com os alienantes e conhecidos ditames de controlo e exploração em múltiplos terreiros (nacionais e regionais) do Poder, sem a devida e proporcionada partilha de custos e culpas a pagar pelas afinal comuns e discriminatórias heranças, a par de outras equivalentes menoridades histórico-geográficas, político-ideológicas, mentais e morais?!
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Publicado em Azores Digital: 
"Diário dos Açores" (Ponta Delgada, 12.08.2012):
 - http://jornal.diariodosacores.pt/;
Outra versão em "Diário Insular" (Angra do Heroísmo, 11.08.2012):
 - http://www.diarioinsular.com/.