Mentes Vazias e Buchos Impantes
Os últimos debates e despiques mantidos,
a par das rocambolescas e virulentas cenas ocorridas na Assembleia Regional, a
propósito do rendimento escolar dos
estudantes açorianos – e a relação que todo esse processo de aprendizagem e desempenho dos nossos alunos possa ter (como
é mais do que sabido que efectivamente também
tem!) com a problemática dos hábitos de
alimentação e das respectivas e integrantes possibilidades e práticas de nutrição (*) –, vieram não só pertinentemente trazer a lume como, para
além disso e muito lamentavelmente, ainda acabaram por permitir fazer descambar tudo aquilo para uma pré-arruaça e um
rasteiro bate-língua de taberna ou caserna…
E isto apesar da seriedade do
tema ter podido constituir uma boa oportunidade para, uns e outros, terem
mostrado mais dignidade, competência, compostura e até mesmo alguma exigível fidelidade ideológica e ética perante fenómenos e factos indesmentíveis
(conquanto complexos) e princípios e
valores intocáveis, cujo esquecimento
ou falsificação não deveriam, em
circunstância alguma, ter sido tão levianamente minorados, escamoteados e instrumentalizados
de parte a parte!
– Entretanto, quase à mesma hora,
insolitamente, lia-se no DN que o secretário-geral do PS acabara de expressar a
sua preocupação com o estado de
subnutrição com “que chegam muitas crianças” aos estabelecimentos de ensino
e com uma escola pública “que reproduz
desigualdades sociais”, confessando, lá fora e cheio de sensibilidade nacional…, assim:
“Naturalmente que fico muito
preocupado com o estado em que muitas crianças chegam às escolas no que diz
respeito às condições de nutrição, (...) sobretudo à segunda-feira”, algo que
“não deveria acontecer”, sublinhou o líder do PS no final de uma reunião com
professores na Marinha Grande, referindo-se a situações relatadas pelos
docentes durante o encontro…
– De resto e por cá, talvez não
tivesse sido despiciendo de todo que ali na Assembleia Regional se houvesse
feito uma destrinça minimamente científica
e socialmente fundamentada entre fome e má nutrição, e bem assim uma outra, justa e politicamente coerente distinção crítica, nomeada e comprovadamente
já estudada e articulável, entre desenvolvimento cognitivo, subalimentação,
pobreza, exclusão, sistema e organização escolar, estruturas socioeconómicas e
familiares, condicionantes psico-comportamentais, educação para a saúde,
assistência e segurança social... E que, de todos daqueles algariados,
susceptíveis e enfatuados actores parlamentares, seria de esperar toda uma
alternativa discorrência coordenada de prudentes discursos, real e empírico
conhecimento de causa, tecnicamente sustentados diagnósticos e consequentes acções
estratégicas!
– Porém, quanto a sensibilidades mais ou menos patológicas, para o mais que apeteceria socioeducativa e politicamente recordar,
que ficassem lá com elas apertadas, mas não de mentes vazias e buchos impantes…
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(*) Veja-se, por exemplo, aqui: http://www.youtube.com/watch?v=dL2KG4cNTK4
Publicado em Azores Digital:
http://www.azoresdigital.com/;
RTP-Açores:
http://www.rtp.pt/acores/index.php?headline=14&visual=10;
Jornal "Diário dos Açores" (Ponta Delgada, 24.03.2013).
Outra versão em "Diário Insular" (Angra do Heroísmo, 23.03.2013).