sexta-feira, março 22, 2013


Mentes Vazias e Buchos Impantes


Os últimos debates e despiques mantidos, a par das rocambolescas e virulentas cenas ocorridas na Assembleia Regional, a propósito do rendimento escolar dos estudantes açorianos – e a relação que todo esse processo de aprendizagem e desempenho dos nossos alunos possa ter (como é mais do que sabido que efectivamente também tem!) com a problemática dos hábitos de alimentação e das respectivas e integrantes possibilidades e práticas de nutrição (*) –, vieram não só pertinentemente trazer a lume como, para além disso e muito lamentavelmente, ainda acabaram por permitir fazer descambar tudo aquilo para uma pré-arruaça e um rasteiro bate-língua de taberna ou caserna…


 E isto apesar da seriedade do tema ter podido constituir uma boa oportunidade para, uns e outros, terem mostrado mais dignidade, competência, compostura e até mesmo alguma exigível fidelidade ideológica e ética perante fenómenos e factos indesmentíveis (conquanto complexos) e princípios e valores intocáveis, cujo esquecimento ou falsificação não deveriam, em circunstância alguma, ter sido tão levianamente minorados, escamoteados e instrumentalizados de parte a parte!

– Entretanto, quase à mesma hora, insolitamente, lia-se no DN que o secretário-geral do PS acabara de expressar a sua preocupação com o estado de subnutrição com “que chegam muitas crianças” aos estabelecimentos de ensino e com uma escola pública “que reproduz desigualdades sociais”, confessando, lá fora e cheio de sensibilidade nacional…, assim:

“Naturalmente que fico muito preocupado com o estado em que muitas crianças chegam às escolas no que diz respeito às condições de nutrição, (...) sobretudo à segunda-feira”, algo que “não deveria acontecer”, sublinhou o líder do PS no final de uma reunião com professores na Marinha Grande, referindo-se a situações relatadas pelos docentes durante o encontro…


– De resto e por cá, talvez não tivesse sido despiciendo de todo que ali na Assembleia Regional se houvesse feito uma destrinça minimamente científica e socialmente fundamentada entre fome e má nutrição, e bem assim uma outra, justa e politicamente coerente distinção crítica, nomeada e comprovadamente já estudada e articulável, entre desenvolvimento cognitivo, subalimentação, pobreza, exclusão, sistema e organização escolar, estruturas socioeconómicas e familiares, condicionantes psico-comportamentais, educação para a saúde, assistência e segurança social... E que, de todos daqueles algariados, susceptíveis e enfatuados actores parlamentares, seria de esperar toda uma alternativa discorrência coordenada de prudentes discursos, real e empírico conhecimento de causa, tecnicamente sustentados diagnósticos e consequentes acções estratégicas!

– Porém, quanto a sensibilidades mais ou menos patológicas, para o mais que apeteceria socioeducativa e politicamente recordar, que ficassem lá com elas apertadas, mas não de mentes vazias e buchos impantes…


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(*) Veja-se, por exemplo, aqui: http://www.youtube.com/watch?v=dL2KG4cNTK4
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Publicado em Azores Digital:
http://www.azoresdigital.com/;
RTP-Açores:
http://www.rtp.pt/acores/index.php?headline=14&visual=10;
Jornal "Diário dos Açores" (Ponta Delgada, 24.03.2013).
Outra versão em "Diário Insular" (Angra do Heroísmo, 23.03.2013).