sábado, outubro 12, 2013



Arquitecturas de Felicidade




Alain de Botton é um dos escritores nossos contemporâneos (nasceu em 1969) cujos ensaios sobre algumas das formas quotidianas e geralmente ditas “pós-modernas” de viver, de pensar e de agir tem granjeado bastante popularidade em todo o mundo (e mais recente e editorialmente também em Portugal), talvez por constituírem uma espécie de escrita intertextual e disciplinarmente eclética, onde diferentes conteúdos psico-existenciais e múltiplos registos socio-experienciais, afectivo-vivenciais, discursivos, éticos e estéticos aparecem articulados de modo sugestivo (conquanto às vezes mais ficcionalmente reconfigurados, aplicados ou acomodados metodicamente de forma nem sempre muito rigorosa ou fiel relativamente às respectivas matrizes, tradições ou universos conceptuais específicos…).



 Por outro lado – ou talvez por isso mesmo – muitas das abordagens e leituras culturais de Botton (vulgarmente e amiúde adjectivado de “filósofo” pop e “filósofo” do quotidiano) tem sido adaptadas empresarialmente, usadas em marketing ou programadas para difusão mediática (televisiva, especialmente), inserindo-se modelarmente em simpósios para gestores e decisores administrativos, espectáculos encenados, live-shows e talk-shows mais ou menos difusores de formas reconhecidamente light ou soft de reflexão (quando não humorísticas, catárticas, pedagógicas e lúdicas), perante plateias aplaudindo em gravação regida, comovedores happenings de estúdio ou sessões que não deixam de ter vários dos perfis e estilos próximos de uma variedade leiga e laica de televangelismo (amiúde maquilhado de retórica “sapiente”, “moral”, “terapêutica” e “científica”…), ou – pelos menos – recheada de referências, provérbios, citações e lugares selectos desse denso, radical, fundamentado, autêntico, exigente e assumido universo hermenêutico-conceptual e ético que constitui, outrossim e então legitimamente, o campo histórico-crítico e o domínio reflexivo e prático próprios da Filosofia!


De entre os vários títulos de Alain de Botton traduzidos em português contam-se Alegrias e Tristezas do Trabalho, O Consolo da Filosofia, A Arte de Viajar, Como Proust pode mudar a sua Vida, Religião para Ateus e Arquitectura da Felicidade (original de 2006).



– Esta última e muito sugestiva obra, que também contém muitas ilustrações apropriadas ao deveras fascinante assunto ali tratado, conforme a recente edição da Leya/D. Quixote (2013) precisamente salienta, parte do direccionamento intencional de olhares e da formulação de perguntas filosóficas sobre toda uma série de fenómenos estéticos, simbólicos e existenciais (pluriculturais e inter-civilizacionais) ligados à Arquitectura e ao seu Significado, ao Estilo e ao Gosto, à Construção Material, à Ordem do Edifício e ao Ideal de Casa, trabalhando assim questões aparentemente tão simples, mas afinal tão potencialmente complexas e virtualmente incondicionadas, como:

– “O que faz verdadeiramente uma casa ser bonita?”, “Porque existem tantas casas feias?”, “Porque discutimos tão amargamente sobre sofás e quadros?”, ou “Poderá o minimalismo fazer-nos mais felizes que a ornamentação?”.
 

Ora é para procurar respostas a “estas e outras perguntas” que Alain de Botton olha para “edifícios dispersos pelo mundo inteiro, das casas de madeira medievais aos modernos arranha-céus; examina sofás e catedrais, serviços de chá e centros empresariais, ao mesmo tempo que tece um conjunto de surpreendentes provocações filosóficas, “convidando-nos a viajar” – e a aprofundadamente dialogar, ou chamar ao mesmo diálogo, os grandes Filósofos que pensaram fenomenologicamente o espaço vivido e as suas estruturas reais e matérias reais e imaginárias… –, “através da história e psicologia da arquitectura e do design, permitindo-nos alterar a forma como olhamos para as casas em que vivemos – e ajudando-nos a tomar melhores decisões”…


– Oxalá que a tanto nos decidíssemos individual e colectivamente, em todas as áreas onde se constrói a felicidade (e a infelicidade) dos povos e das gerações, mais que não fosse por esta última razão de ajuda (que é de Vida, de Cultura, de Património e de Identidade), cada vez mais necessárias a um País como o nosso, que empobrece em tudo menos na arquitecturada infelicidade do presente e na fealdade do seu futuro próximo!
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Em "Diário dos Açores" (Ponta Delgada, 12.10.2013):




























RTP-Açores:

Azores Digital:
http://www.azoresdigital.com/colunistas/ver.php?id=2450,

e "Diário Insular" (Angra do Heroísmo, 20.10.2013):