sexta-feira, novembro 15, 2013


A Banalização do Exílio



Mário Soares, ex-PR, ex-PM e fundador do PS, acaba de ser simbolicamente homenageado em França, tendo-lhe sido entregue pelo maire da “cidade luz” a Grande Médaille de Vermeil de la Ville de Paris.

– A linda cerimónia, no Hôtel de Ville, contou com a presença, entre figuras gaulesas e nacionais, de Jospin (ex-PM e ex-líder do PS francês), mas acabou por ficar, acima de tudo, marcada – embora sem notoriedade externa, mas mesmo assim como motivo de interesse na velha terra lusitana (agora, nas plagiantes e delico-doces sentenças do vice-PM, transformada em mísero e dependente “protectorado”) –, pela mui relevada e prestigiante comparência entre os convidados (presume-se que por oficioso conchavo protocolar inter-pares) do também ex-PM e ex-condottieri do ex-PS de Soares, José Sócrates!

Até aqui tudo estaria nos conformes, êxtases e desvanecimentos da ilustrada entourage daqueles camaradas euro-socialistas, não fosse o que de seguida mais assombrou a pompa da dita circunstância, quando Mário Soares, com a incauta (?) bonomia que é apanágio da sua magnânima personalidade, depois de evocar os seus propedêuticos e penosos tempos “de exílio” democrático, e após tanger forte e feio no primo-comissário Durão, na troika, na austeridade, em Merkel e no governo do seu País, dirigindo-se ao novel “mestre” ali acolhido – porém mediaticamente não encolhido! –, resolveu perorar neste laudatório:

– “Sou um grande amigo de Sócrates e penso que ele está a passar pelo mesmo que eu passei, que vivi aqui quatro anos no exílio – penso que ele, depois de dois anos em Paris, também é outro homem, com uma cultura que não tinha antes”...


A tais palavras, parolas (apenas paroles?), hão-de varrê-las, algum dia, limpos e novos ventos em Portugal (e talvez até no PS)!

Mas a tamanha falta de auto-estima, tão confrangedor aviltamento da imagem pessoal própria e tão ignóbil torção da verdade histórica, só a mais abjecta e ofensiva banalização ética de um exílio político poderia ter verbalizado em igual retórica cínica, gerando, no duplo espelhado da respectiva representação, o fantasma da sua vacuidade.
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Publicado em "Diário Insular" (Angra do Heroísmo, 16.11.2013).


Azores Digital:
http://www.azoresdigital.com/colunistas/ver.php?id=2470



Jornal "Diário dos Açores" (Ponta Delgada, 20.11.2013):


RTP-Açores: