quarta-feira, setembro 10, 2014


Os Declínios do Ocidente



Niall Ferguson, nascido em Glasgow (1964), é um conhecido historiador inglês, professor em Harvard e investigador em Oxford. Colunista habitual da Newsweek, documentarista na BBC e autor de livros já famosos e artigos de referência sobre a História da Civilização (especialmente a partir de abordagens político-institucionais, jurídicas e geoeconómicas), a sua obra The Great Degeneration: How Institutions Decay and Economies Die (original de 2012) foi traduzida e editada há poucos meses em Portugal pela D. Quixote com o título – um pouco abusivamente ajeitado e até indevidamente plagiador do clássico, monumental e homónimo estudo de Spengler... – O Declínio do Ocidente, sendo que, em todo o caso e para o que esta Crónica importa, o respectivo subtítulo desse livro ajuda a clarificar o seu horizonte temático (“Como as Instituições se degradam e a Economia morre”), tal como também o índice dos capítulos sugestivamente aponta e desenha dos pressupostos e núcleos ali em análise (“A colmeia humana”, “A economia darwinista”, “A paisagem jurídica” e “Sociedade civil e sociedade sem civismo”). 


– A obra, como em nota de contracapa vem sintetizado, pretende de facto ser “uma acusação polémica e poderosa a uma era de desleixo e complacência” da “outrora dominante civilização ocidental”, hoje vitimada por “crescimento económico lento, dívidas galopantes, populações envelhecidas e comportamentos anti-sociais”, tudo sintomas que são atribuídos a uma deterioração das melhores instituições paradigmatizadas por ele, enquanto pilares das sociedades livres e prósperas da Europa Ocidental e da América do Norte (mas não por “vantagens geográficas ou climáticas”...) pela existência e papel histórico-jurídico e axiológico do Governo Representativo, da Economia de Mercado, do Estado de Direito e da Sociedade Civil), o que as teria colocado, desde cerca de 1500, “na rota do domínio global” (sic) do Mundo...


 Pese embora o notório e conhecido quadro das (díspares e discutíveis...) filiações, proximidades e/ou (contra)posições teóricas e ideológicas de Ferguson (Davis Landes, Fukuyama e Jared Diamond, Adam Smith e Darwin, Mandeville e Locke, Burke e Tocqueville, Gibbon e Toynbee, Hobbes e Hayek, Friedman e Keynes, etc.), a sua obra merece leitura e reflexão, nesta era de colapsos societários globais, caótica degradação político-institucional e reacendido conflito de Civilizações e Culturas!

– Essa reflexão, com olhos críticos, evidentemente, será bem proveitosa para todos, ou não estivéssemos, para além do mais e dos cenários onde globalmente nos inserimos (e também amiúde declinamos e regredimos...), sob aquilo a que Niall Ferguson apelida de “o primado dos advogados” (ou da primazia antidemocrática, alienante e (coisa bem diferente do primado da Lei e da Justiça!) e sob o domínio hegemónico e neo-colonizante dos farsantes e agiotas do Capital monopolista e explorador, da Banca usurária e da Alta Finança corrupta e corruptiva (aparelhos estes identicamente bem diferentes de uma estruturação e finalidade outras da Economia, do Trabalho e do Desenvolvimento)...


A preocupação de Ferguson, nesta The Great Degeneration, como ele salienta precisamente, “não tem a ver com o desenvolvimento económico, mas antes com o processo inverso da degeneração institucional. A minha pergunta mais abrangente é a seguinte: o que foi exactamente que correu mal no mundo ocidental dos nossos dias? Respondo a essa pergunta na crença de que, enquanto não compreendermos a verdadeira natureza do nosso declínio, estaremos a perder tempo, a aplicar remédios de charlatão ao que não passa de sintoma. Sou também acicatado pelo medo de que, paradoxalmente, o estado económico estacionário possa ter consequências políticas assustadoramente dinâmicas”.

– Assim sendo, neste quadro de profunda degeneração e de explosivos cenários de caos à escala planetária, o autor pode concluir, avisadamente, com as seguintes palavras, cuja aplicação concreta ao caso de Portugal, nomeadamente no que concerne às relações entre Política, Economia, Sociedade, Direito e Justiça não pode deixar de ser considerada, em toda a linha de verdade e de mentiras que caracterizam o nosso dramático presente e comprometem o incerto futuro do nosso País.


Enfim, aonde Ferguson diz “advogados”, os seja os potenciais defensores primeiros da Lei e do Estado de Direito – mas podendo, talvez, ali ler-se intelectuais ou pensadores realmente livres (não “orgânicos” nem ao mentecapto serviço carreirista, táctico e laudatório de todos os viciados aparelhos partidários), cidadãos atentos, responsáveis, empenhados, participativos e limpos, e líderes cívicos, culturais e morais –, valeria por inteiro o seguinte:


“Os países chegam ao estado estacionário (sublinhado meu) quando, como defendeu Adam Smith, as respectivas ‘leis e instituições’ degeneram a tal ponto que as elites ávidas de rendas passam a dominar o processo económico e político. Tentei sugerir que é esse o caso em partes importantes do mundo ocidental contemporâneo. A dívida pública – expressa e implícita – tornou-se uma forma de as gerações mais velhas viverem à custa das gerações mais novas e dos nascituros. A regulação tornou-se disfuncional ao ponto de acentuar a fragilidade do sistema. Os advogados, que podem desempenhar um papel revolucionário em sociedades dinâmicas, tornam-se parasitas numa sociedade estacionária. E a sociedade civil vegeta numa mera terra de ninguém entre os interesses e o estado invasivo. Todas juntas, estas são as coisas a que chamo O Grande Declínio”!
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Em "Diário dos Açores" 
(Ponta Delgada, 11 de Setembro de 2014):