terça-feira, janeiro 20, 2015



Regressões e Retóricas Radicais
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1. Precisamente há dois anos – quando Vasco Cordeiro recebeu um “Relatório”, o famoso e patético relambório (1) da Praia da Vitória (aqui analisado em 30.01.2013) sobre as colisões da presença americana na Base das Lajes, – e quando na altura ouvimos ser afiançado, quase afrontosamente para os pequenos (dos) Açores, pela melíflua e soberana autoridade político-militar e diplomática nacional do ministro Aguiar Branco, que as relações Portugal-EUA (como se isso fosse novidade táctica ou estratégia actual de Lisboa…) iam muito para além dos doirados “peanuts” do Campo das Lajes –, publiquei também aqui (2) (13.01.2013) uma Crónica (“As Lajes em Fogos de Alto”) onde eram feitas ponderações sobre uma Nota-Esclarecimento oficial (3) do Governo Regional dos Açores (GRA) na qual eram desmentidas e corrigidas afirmações do presidente da autarquia praiense, – entendendo aí formalmente o GRA ser “útil e necessário esclarecer”, por ser falso e contrário ao referido pelo autarca local, que um (na altura muito apregoado) “interesse” de empresários pela Terceira resultasse “do trabalho desenvolvido” pelo chefe do executivo regional nos USA, onde fizera contactos “no sentido de encontrar soluções” que minimizassem “o impacto da redução militar” na Base das Lajes.




 – E depois, porque aquele edil alegara que tal informação lhe fora “transmitida pelo próprio presidente”, logo o gabinete de Cordeiro viria acentuar, em relação à vinda dos tais empresários, ser a dita “uma iniciativa do Governo dos EUA, promovida pela [sua] Embaixada (...) em conjugação com o Comando Europeu há já algum tempo”, mais precisando-se que o respectivo programa e actividades tinham sido trabalhados entre as autoridades americanas e o GRA, sendo através deste que fora “promovida a participação das entidades representativas dos empresários da Ilha Terceira e o Município da Praia da Vitória”!


 De resto este paradigmático episódio, simultaneamente recordatório e premonitório de muita História regional e nacional, merece ser recordado agora, quando a Praia da Vitória e a sua actual gestão político-partidária aparecem totalmente vulneráveis, decisoriamente impotentes, descredibilizadas, quase sem nenhuma miragem de salvaguarda ou saída “sustentável”, e completamente à margem do que lhe diz respeito (dir-se-ia direito ao respeito!), como ficou sobejamente demonstrado com o chamado (e escamoteado...) “Plano de revitalização” da Terceira, para além de umas esparsas e ridículas bravatas mediáticas e outras retóricas “radicais” sem consistência...



2. Ora enquanto tudo isto acontece, por unanimidade, a Câmara Municipal de Angra do Heroísmo (4) acaba (16.01.2015) de chegar-se (liderante?) à frente da batalha terceirense, tomando uma inédita posição reivindicativa a nível regional, nacional e internacional, mas sem sequer nomear significativamente os Praienses e – em termos institucionais, económico-sociais, laborais, populacionais e políticos! – a triste, inócua e destroçada Praia da Vitória, os seus órgãos autárquicos (mal ou bem ainda formalmente representativos) e todo aquele Concelho, – áreas geográficas e populacionais afinal as mais imediatamente próximas da Base e as mais atingidas pelos impactos previstos, desde há muito previsíveis e presentemente já consumados.

– Porém é neste contexto, e já após a divulgação do pronunciamento e frontal “Deliberação” angrense sobre a redução dos efectivos na Base das Lajes, que nos chegam ecos das primeiras reacções (reservadas e cabisbaixas...) ao documento da autarquia presidida por Álamo Meneses (PS), nomeadamente no que decorre dos seguintes pontos e passagens relevantes:

“ A Câmara Municipal de Angra do Heroísmo delibera: “1 – Repudiar veementemente a forma e o conteúdo da decisão unilateral do Governo dos Estados Unidos da América, por esta: “a) Prejudicar de forma desproporcionada o Município de Angra do Heroísmo, onde residem muitos dos 500 trabalhadores que serão despedidos e onde tem sede a maioria dos agentes económicos direta e indiretamente afetados pela decisão; (...) d) Ignorar e desconsiderar os fortes impactos que da mesma resultam para os açorianos, mas muito em particular para os terceirenses, considerada a redução expectável de 10% na economia da ilha Terceira (...); “2 – Exigir ao Governo dos Açores e ao Governo da República a colocação imediata ao serviço dos terceirenses de todos os recursos necessários à proporcional compensação dos efeitos emergentes da decisão norte-americana, (...), no âmbito de um plano de revitalização económica para a ilha Terceira (...); “3 – Exigir a imediata reavaliação da presença norte-americana nas Lajes, elaborando um estudo que de forma transparente permita contabilizar as vantagens e desvantagens dessa presença, da concessão de facilidades a outros Estados ou organizações internacionais e a determinação de usos alternativos para aquela infra-estrutura (...); “5 – Exigir aos norte-americanos que procedam aos trabalhos de integral remoção do passivo ambiental resultante da sua presença na Base das Lajes, nomeadamente a descontaminação dos solos e aquíferos da Praia da Vitória, de forma a garantir a qualidade ambiental pela qual os Açores são conhecidos e gerar emprego, nomeadamente na área da construção civil; (...) “7 – Exigir ao Governo da República que os edifícios integrados na Base das Lajes que serão devolvidos às autoridades portuguesas, (...) sejam imediata e integralmente entregues ao Governo dos Açores para que possam ser colocados ao serviço do desenvolvimento económico da ilha Terceira”...


 3. Agora, para além do mais, perante o tal enevoado (e talvez regionalmente bem controverso...) “Plano de revitalização” da Terceira; face ao Documento angrense, e diante daquilo que ambos podem traduzir e veicular, o que se aguarda é uma tomada de posição da Praia da Vitória, apesar das cada vez mais isoladas e bloqueadas posições político-partidárias internas e regionais (ou devido a elas...) em que Roberto Monteiro se deixou cair, compelindo a “sua” Câmara, o GRA e o próprio PS!


 Todavia, exemplar e realmente radicais (isso sim, e possivelmente justificadas em toda a linha), seriam atitudes que chegassem à demissão inteira do executivo camarário na Praia, corajosa e simbólica atitude esta, no entanto, que não se vislumbra ao alcance das estaturas e estruturas (profundamente divididas e endividadas...) dos agentes e actores em causa e cena no Ramo Grande e na Terceira, até porque, messianicamente à socapa, vão-se já alinhando à mesa o pires e a chávena para o acre chazinho da sucessão...

– Mas para cúmulo deste descalabro sistémico, com fogos de alto histórica e ciclicamente recaindo sobre o nosso País e suas vergonhosas imundices e incríveis sub-mundices institucionais e diplomáticas, só nos faltava a retórica arrogante, sibilinamente imperial, da afrontosa Entrevista do embaixador yanquee em Lisboa (5), como se Portugal estivesse rastejante – pedinte, apenas (des)armado de arco e flecha ou de testa no chão... – no Far West, no Mid-East ou colonialmente regredido ao estádio de tribo e povo berbere, quando não de Estado pária ou falhado, em plena Europa e no coração do Atlântico.


– Em todo o caso, o mal (a origem e a derivação) de tudo isto vem de há décadas, remontando às permanentes contingências e vicissitudes histórico-políticas, mentais e culturais que sofremos com maior gravidade relativa e com oscilantes (ir)responsabilidades (6) desde meados do Século XX até hoje (desde os tácticos ajustes possíveis das chancelarias de Salazar e Marcello até aos consabidos tropeções de Machete & Cia), pese embora não poderem aquelas servir de desculpa ou lenitivo contemporâneo para a menoridade culpável, a preguiça de pensar, a incoerência no agir e a completa vacuidade e desorientação das actuais “elites” (ou melhor, dos seus próceres institucionais, representantes de aluguer “ad hoc”, agentes delegados dos poderes e quejandos actores de substituição e soberania inferior!), como se tornou a comprovar à evidência durante a regional semana passada, nos respectivos, dramaticamente mediatizados e confrangedores fandangos nativos...
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 (3) Cf. em:
 (4) Texto integral aqui: http://www.cmah.pt/artigos/ver.php?id=1313.
(6) Neste âmbito crítico situe-se, para extensão singular, a Entrevista de Vasco Cordeiro à RTP, aqui:

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Em "Diário dos Açores" (Ponta Delgada, 20.01.2015):



























RTP-Açores:
http://tv2.rtp.pt/acores/index.php?article=38947&visual=9&layout=17&tm=41: