Economia, Moral e Política
Depois de
escrito e publicado neste jornal a nossa habitual Crónica da semana passada,
tiveram lugar as mais do que expressivas, impressionantes e gigantescas
manifestações populares nacionais (que falaram por si!) contra a política do
governo de Passos Coelho, a par da continuação das já esperadas ou previsíveis e consabidas tomadas de posição por
parte dos partidos, parceiros e formações sociais, das quais é justo salientar
o exercício de equilíbrio político-partidário (com algum denunciado mas notável
e controlado malabarismo à mistura…) de Paulo Portas, e bem assim os reacendidos
argumentos de políticos, economistas, sociólogos e analistas sociais, e de
entre eles os de Manuela Ferreira Leite (no jornal
i do dia 15) e de Vítor Bento (https://www.youtube.com/watch?v=QVscITlSkTY&feature=player_embedded),
em entrevista à TVI.
Quanto a esta
última intervenção, mesmo sem entrarmos de pleno em âmbitos fundamentais e
próprios da Filosofia Política, ou logo em questões
ideológicas (conquanto estas nunca possam ser escamoteadas nas respectivas funções e escalas!), deve ser dito aqui
que muitas das suas reflexões, vindas aliás na linha de abordagens prévias (v.g.
em http://www.youtube.com/watch?v=TaXilMs8250&feature=related),
haviam já sido feitas anteriormente também por outros, embora com variantes de
discurso e argumentos.
– De qualquer
modo, como seria de aguardar de um economista (e Conselheiro de Estado) tão
sério, ponderado e consciencioso como Vítor Bento, é sempre bom repensar, frontalmente
e sem falsificações iníquas, as
doenças do País, o remédio e o seu sucedâneo, como ele diz… Coisa que
Passos Coelho, infeliz, irresponsável e incompetentemente, não soube, nem nunca
certamente saberá fazer!
De resto,
muitas das questões teóricas e práticas aqui e ali abordadas andam
irrecusavelmente centradas naquilo que na obra Economia, Moral e Política (Lisboa, FFMS, 2011) vem assumido assim:
– “Como se
poderá verificar […], sustento, nomeadamente, que a Economia, enquanto estudo
da realidade ou, mais propriamente, do comportamento humano relacionado com a
actividade económica, é uma ciência positiva e, como tal, (praticamente)
autónoma de considerações morais. Mas que a economia, enquanto actividade
humana, funciona sempre em contextos morais. E que toda a acção que visa
influenciar o funcionamento da economia, ou mesmo os juízos formulados sobre
esse funcionamento e os seus resultados, são, sempre e por natureza, moralmente
orientados e dependentes da escala de valores morais de quem julga ou de quem
age (ou quer agir). E que uma tal acção pertence, também por natureza, à
Política.
“ […] É claro
que, quanto mais diversas forem as escalas dos intervenientes, mais difícil
será a eficácia da acção política, quer se trate da sua formulação, quer se
trate da sua concretização. Por isso, as sociedades que melhor conseguem
articular o seu funcionamento e a sua acção política são aquelas em que é
possível criar consensos morais para a acção política”…
– Lúcidas e
prudentes palavras estas para os perigosos e abismais dias que correm, aonde,
na inversão exacta da expectável e
paciente ordem das coisas, dos valores e dos sacrifícios, quiseram vender lebre por gato a todo um adiado e agora revolto País …
Por outro lado
e entretanto foram-se sucedendo as mais diversas tomadas de posição sobre a
muita crítica e real situação do País,
para a qual, aliás, não é fácil encontrar uma solução equilibrada, justa e
minimamente prestigiante, tanto interna como externamente e face ao essencial
que importa salvaguardar, como todos os portugueses puderam certamente tornar a
constatar hoje perante a cegueira, a surdez e o mutismo invertido (ou de
substituição) que se verificaram no debate realizado na Assembleia da
República!
Porém, nos
Açores, o tempo tem sido de tempestade, de esgalhar árvores e apresentação de
listas de candidatos, sabe-se lá qual das tormentas a mais difícil de suportar,
gerir e remediar no futuro, – seja ela o dos anticiclones autonómicos, a dos
ventos e assentos parlamentares, a da dança das pastas executivas próximas ou a
das Autárquicas do ano que vem (para onde muitos dos ditos estariam de facto e
estrategicamente tão bem posicionados como dedos numa luva à medida…), – mesmo
sem levar em linha de conta as produções, talentos mediáticos, audiovisuais ou
quejandos que as mais ou menos felizes ou conseguidas feituras de dobragem de
voz, enredo e legendagem – nas máquinas partidárias ou em outros centros de
propaganda e contra-propaganda anónima, clandestina ou apenas mafiosa e
incautamente (en)coberta… –, vão vendendo à porta de cada um e nas redes
sociais, à falta de melhor e mais assumido meio e assinatura, entre pequenos
grandes ramos e areias atiradas aos olhos dos eleitores e contribuintes…
E para tal nem
será sequer necessário abrir o YouTube,
o Facebook ou os sítios partidários
que muito em moda e alta estatística de acesso e recomendação de consulta vão
granjeando por aí:
– Basta abrir a portinhola da caixa do correio, a janela de casa ou a do
carro, para sentir no ar um antigo cheiro a pólvora, como antigamente se dizia
e fazia em Ilhéus, no tempo recorrente ou remoçado dos velhos e duros coronéis,
capitães do mato, jagunços e suspirantes moças românticas e passionais, todos à
espera da hora da telenovela dos outros, quando não ou afinal eles mesmos já
propriamente dentro dela, como figurantes inocentes (?) mas úteis de uma
tragicomédia, insularmente repetida ad
nauseam, porém que tornará a ultrapassá-los irremediavelmente de novo e
mais depressa do que se imagina!
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Publicado em "Diário dos Açores" (Ponta Delgada, 23.09.2012).