sábado, maio 31, 2014



OS SALTEADORES DO PAÇO

O que se viu nas últimas eleições – e de quem para elas se marimbou (80% de abstenção nos Açores – bonito sinal de cidadania autonómica, sem dúvida, e a merecer foguetório de “vitória”!) –, foi de tal dimensão que devemos retomar o que merece ser pensado, tanto mais quanto a antes citada caixa de pesadelos e maldições de Pandora está já a deixar sair vários daqueles sintomáticos fantasmas – muitos deles previsíveis... – que a velha, cega e cínica Europa, com muitas das suas regiões, vem gerando em suicidário bojo...



– Dito e redito isto (conquanto não estando em causa a invocada e real necessidade de revisão de processos, ideários e práticas dos partidos, cá e lá obviamente, mas desde há muito!), como não pasmar das neo-patéticas cenas de perfeito desvario – despeito fratricida, ambição pessoal ou atracção pelo abismo? – que o País inteiro testemunha face à fria e calculista consumação das puras jogadas de ponta e mola nas duras hostes de Costa contra as maviosidades tácticas de Seguro (às quais por certo sucederão almejadas minagens aos trilhos para Belém...), e onde nem faltaram, em indigente coro ilhéu (41 em 20% de eleitores!), tremendas vociferações e demolhadas prosas de casticismo inócuo carpindo sobre tão (mal)dita e pirrónica “vitória bisonha” – “uma alcatra sem Jamaica, um verdelho a 10 graus” (sic) –, ali à porta desta expiatória ultra-perifericidade, hoje pseudo-democrática e pseudo-autonómica ainda, cívica e culturalmente ébria de ficções e mitos enganadores, como se tudo se resumisse (na Europa, no País, nos Açores e em todos os quadrantes político-partidários) a uma pugna de garotos armados com fisgas, ou a chusma de velhacos metralhando a frio, e desleais, aos tombos e empurrões extemporâneos, qual bando de salteadores, cada um a correr para sua banda nas escadas, salas e varandas do Paço, todos à procura de um (talvez agora mais remoto!) buraco na despensa ou na sala do trono, cujos actuais e coligados reis e xerifes, em confrangedor protectorado euro-luso, podem assim gerir na recuperação da sua derrota, como se esta fosse, ou tivesse sido, uma inesperada e dadivosa vitória à outrance...
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Em "Azores Digital":


















e "Diário Insular" (Angra do Heroísmo, 31.05.2014):






As Equidades e os Salteadores

1. Nem que por coincidência, nas últimas horas de 23 Maio, quando se comemorava o 91.º aniversário de Eduardo Lourenço, relia eu textos que integram A Europa Desencantada, tendo ao lado um “Diário Insular”, uma revista de Imprensa estrangeira e uma primeira página da colecção (esquecida?) de um quinzenário crítico que se publicava na Praia da Vitória lá pelos anos 80 do século passado... Na altura, recordo, estávamos à beira da suspensão da enfastiante campanha para as Europeias, que alegadamente era para “reflexão” política nossa, isto é, dos cidadãos que aos hábitos e actos democráticos do Voto nunca se deveriam esquivar, nem por absentistas artes de furtar deixar de em consciência fazê-lo cair na ranhura da “urna” (palavra que continua a soar-me fatídica e a retinir sentido de funérea caixa de Pandora)!
 
 


Ora tudo aquilo, que à primeira vista não suscitava nenhuma ligação temática, teve de repente o condão de completar uma espécie de arco reflexivo – expressão que também me fez empeçar nas voltas e reviravoltas do “arco da governação” e que logo me aproximou similarmente das declarações de um politicão da direita gaulesa, das terra-a-terra-minha-gente serventias de argumentação para montagem de pretensos auto-motores autonómicos (de um ex-secretário regional), por um lado, e (por outro) de dois bravos e embravecidos editoriais que, separados por 31 anos (“JP”: 25.03.1983 – “DI”: 21.05.2014), forte e feio batiam na mesma tecla de um “cerco” à Terceira!

E desse modo – por entre as filosóficas e heterodoxas reflexões do autor de O Fascismo Nunca Existiu, as xenófobas e radicais congeminações do Sarkozy (com propostas de suspensão do Acordo de Schegen!),  e as tentações hegemónicas intestinas de uma insólita e presumida (não historicamente inédita, porém falsa e falseada) equidade  (sic) na “repartição dos recursos postos à disposição pelos financiamentos comunitários”... –, nenhuma diferença  (a não ser de escala e despudor) detectei nos equivalentes propósitos das respectivas (in)coerências desenvolvimentistas e de coesão euro-açoriana, até porque desalmadamente construir o que quer que seja “por irresistível pressão das forças económicas (...), como sonâmbulos, não é projecto que entusiasme ninguém”...


2. Quanto às eleições foi o que se viu nos resultados – e em quem para elas se marimbou, como neste luso arquipélago autonómico (80% de abstenção – bonito sinal de cidadania, sem dúvida, a merecer foguetório de “vitória”!) –, de tal maneira que o tema merece ser pensado, tanto mais quanto a citada caixa de pesadelos e maldições parece estar já a deixar sair vários daqueles sintomáticos fantasmas – muitos deles previsíveis... – que a velha, cega e cínica Europa e as suas regiões de periferia e ultraperiferia societária vem gerando em suicidário bojo...

E depois, aos pequeninos e incautos redutos de certas mentes insulares, atendendo às suas bairristas afinidades e tentações – versão provinciana de nacionalismo serôdio, frentista e populista (à gaulesa.!?), que temos vistos irem-se desencabrestando aos poucos ao longo destas décadas de Autonomia (e sem que ninguém lhes segure a rédea a tempo e tino) –, como não continuar a aplicar-lhes aqueles juízos que, embora noutro contexto, o nosso relembrado aniversariante formulara em 1976:

– “Reunir-se para verificar que se não está de acordo, é reflexo salutar e democrático. Mas fazê-lo para mostrar que o projecto socialista pouco ou nada tem de comum na boca dos seus apoderados, mais ou menos gloriosos, é um exercício de masoquismo político-ideológico que frisa o suicídio. (...) Podia, contudo, esperar-se um mínimo  – entenda-se, um ‘mínimo positivo’ – de coerência ideológica e política (...) em termos que ultrapassassem o do oportunismo e a demagogia da tradição burguesa mais lamentável, vazia e sinistra”.


3. Finalmente, dito isto e redito (conquanto não estando em causa a invocada e real necessidade de revisão de processos, ideários e práticas dos partidos, cá e lá obviamente, mas desde há muito e não de agora!), como não pasmar das neo-patéticas cenas de perfeito desvario – despeito fratricida, ambição pessoal ou mirífica atracção pelo abismo? – a que o País inteiro assiste face à fria e calculista consumação de jogadas de ponta e mola nas duras hostes de Costa contra as maviosidades tácticas de Seguro (às quais sucederão almejadas minagens aos trilhos para Belém...), e aonde nem faltaram, em indigente coro ilhéu (41 em 20% de eleitores!), tremendas vociferações e demolhadas prosas de casticismo inócuo carpindo sobre tão (mal)dita e pirrónica “vitória bisonha”... – “uma alcatra sem Jamaica, um verdelho a 10 graus” (sic) –, ali à porta desta expiatória ultra-perifericidade, já hoje pseudo-democrática (e mais pseudo-autonómica ainda, cívica e culturalmente ébria de ficções e mitos enganadores!), como se tudo se resumisse (na Europa, no País, nos Açores e em todos os quadrantes político-partidários) a uma pugna de garotos armados com fisgas, ou a chusma de velhacos metralhando a frio, e desleais, aos tombos e empurrões extemporâneos, qual bando de salteadores, cada um a correr para sua banda nas escadas, salas e varandas do Paço, e todos à procura de um (talvez agora mais remoto!) buraco na despensa ou na sala do trono, cujos actuais e coligados reis e xerifes, em confrangedor protectorado euro-luso, podem assim gerir a recuperação da sua derrota como se esta fosse, ou tivesse sido, uma inesperada e dadivosa vitória à outrance...
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Em "Diário dos Açores" (Ponta Delgada, 31.05.2014):