sábado, julho 28, 2012


As Tendas da “Silly Season”



“Silly Season” é uma expressão anglo-saxónica muito usada, corrente e já globalmente tradicional para identificar a época de Verão e os respectivos tempos e ritmos calmosos, mais ou menos supostamente letárgicos e modorrentos, de pasmaceira ou torpor, como se a existência activa, as sensibilidades e as consciências ficassem então possuídas de uma espécie de sonolência lenta ou abúlica que fizesse perder a noção das realidades e dos problemas do quotidiano

E tudo isto, paradigmaticamente, sob a torreira do sol, as ondulações do mar, as mornas envolvências da areia das praias, a abençoada frescura das árvores, a pacífica e pacificante sombra das pazes campestres, ou a trepidante e frenética dança de cinturas e cabeças que longos dias e cálidas noites – entre refrescos e alguns cocktails (em salgalhada de mau gosto partidário amiúde inseridos em pepineira fanática nas redes sociais, com músicas vivaças ou cantigas ao luar e à mistura…) – vão fazer abanar e talvez cair a alguns, por entre sorrisos de conquista, assédio, pequenas e grandes tentações ou fantasias para todos os gostos, e muitas tendinhas e grandes barracas em velhos e novos acampamentos de interesse!

– Todavia, nesta altura em que todos procuram usufruir de um retemperante descanso estival ou gozar das chamadas “férias grandes”, aquela denominação (à letra: estação tonta ou imbecil…) continua a ser especialmente usada na gíria política e jornalística para significar a quadra do ano em que nada de importante e decisivo se mostra ou aparenta (não) acontecer na vida social e institucional, enquanto a chamada “classe política” vai a banhos ou a outras vilegiaturas de tipo turístico e desopilante, após um ano de pesados (mas não necessariamente forçados) trabalhos e ciclópicas canseiras executivas, parlamentares, tribunícias, autárquicas, etc.

Ora, como é sabido, essa e esta, a nossa, também cosmopolitamente assumida estação ocorre num ritual intocável e impoluto, aonde corpos e almas vão buscar urgente alento (e, às vezes, bem necessária e real inspiração) para aquele outro ciclo da vida pessoal, ou das (suas) carreiras políticas, que dá pelo outonal e suave nome francês de “rentrée”…

– E não há mesmo partido que se preze que não tenha até já planeado o seu palco de animações, ou um parque de diversão, para tão fatalmente previsto, grandioso e mobilizador desfile de actores institucionais e de exímios protagonistas da política-espectáculo que temos, enquanto o País arde e desespera com maus agoiros e ventos cruzados de todos os quadrantes, como naquela parábola do incêndio na Cidade, ao lado da autista tenda do grande Circo (como o filósofo Kierkegaard lúcida e previdentemente contava).

E todavia, a par de idênticos alheamentos nossos contemporâneos, cá temos o mesmo Povo, cada vez com menos Pão mas batendo palmas entre alienações e festarolas de Verão, já nas vésperas das pateadas e da fuga às responsabilidades, quando as contas forem tiradas a limpo, depois de tanta incauta e irresponsável brincadeira com o fogo durante sucessivas, acumuladas e arriscadas silly seasons, – bem armadas todas à tradicional moda portuguesa, desde Belém ao Caldeirão do Corvo, passando ali pelas sedes partidárias à portinhola de cujas barracas as primeiras cabecinhas a despontar não auguram nada de promissor…

– E assim parece que iremos de imaturidade em casmurrice crescentes até aos derradeiros desplantes e à derrota final, coisa aliás bem adequada ao espírito da presente quadra, e da outra que, daqui a um ano, promete trazer do mesmo ou pior, perante a cobarde claudicação dos créditos de quem deveria, sem miopia partidária ou estupidez política, ver muito mais e melhor para cada uma das nossas ilhas e para a Região no seu todo! 
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