sábado, setembro 10, 2016


As Concessões e as Trocas
ou As Hipotecas Delirantes 
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O meu colega professor e filósofo Viriato Soromenho-Marques (VSM) publicou no JL uma Crónica (“O lobo pelas orelhas”) – a propósito do “enorme número de concessões a empresas nacionais e estrangeiras para a prospecção e exploração de combustíveis fósseis em todo o território nacional, que este governo herdou de anteriores governos” – na qual foi abordada importante temática ecológico-científica, político-moral e ética, sendo que “os casos mais conhecidos (...) passam-se no Algarve e no Alentejo, envolvendo concessões em terra e no mar”.

– Todavia, para além de objectiva denúncia dos factos, VSM, tomando Thomas Jefferson como interlocutor referencial, levou a sua reflexão até um plano mais fundamental (esse que “tem estado obscurecido do debate” e que é o da ética pública), sendo assim que nesta leitura crítica se tratou – perante “benefícios privados e desgraças públicas”... – de averiguar da legitimidade de tais concessões (como aliás poder-se-ia fazer com outras paradigmáticas decisões políticas ou de governança institucionalmente hegemónica), confrontando-as com princípios universais como sejam: 1) o da justiça entre gerações e 2) o do primado do interesse público sobre a utilidade privada...




“No que respeita ao primeiro princípio (...) – continua o autor do texto em apreço – o futuro presidente dos EUA explica que nenhuma geração (...) poderia tomar opções que condicionassem de modo irreversível a liberdade de escolha das seguintes. (...) Ora as concessões que os governos de Sócrates e Passos Coelho assinaram chegam a atingir 45 anos de duração. Elas seriam inadequadas por um ano, pois são intrinsecamente mal concebidas, quanto mais criando uma blindagem temporal tão vasta. Com que direito um punhado de políticos, escondidos no anonimato da sua insignificância, tornam refém uma nação inteira e o seu território emerso e submarino ao longo de sucessivas gerações, amarradas a decisões insensatas de que estão condenadas a sofrer as consequências?

“No que diz respeito ao segundo (...), é seguro afirmar que, neste momento, as concessões concentram todos os eventuais riscos e prejuízos sobre o país inteiro, e os lucros potenciais apenas nos acionistas das companhias envolvidas.

“Mais ainda. As concessões violam a aposta que Portugal tem realizado nos últimos anos nas energias renováveis, e o compromisso internacional no combate às alterações climáticas. É uma profunda incoerência política e uma ignomínia moral”.


 – E depois, como VSM certeiramente constata e pode concluir, as crises (europeia e nacional) têm revelado “a profunda incompetência de muitos dos titulares eleitos para altos cargos governativos”, não se tratando “só da estupidez e da persistência no erro”, antes “também do mais puro analfabetismo em matéria moral” (e, aduza-se, político-filosófico)!



Esta Crónica, cuja atenta leitura recomendo e a cujos alcances locais e regionais açorianos voltarei, traz-nos hoje uma valiosa carga de fundamentos teoréticos e de exigentes incidências práticas, podendo, por exemplo, ser aplicada às agendas e problemas históricos (conjunturais e estruturais...) dos Açores, da ilha Terceira e da Base das Lajes, partindo tanto das iniciais concessões e das sucessivas trocas de facilidades militares, financeiras e diplomáticas como dos contemporâneos protelamentos, impasses e logros, perante riscos, poluições e lixos, velhas pistas e novas plataformas para desastres, artifícios, artimanhas, fumos e fogos sem precaução nem transparência:




 – De facto, como aqui já escrevi, notícias vindas ultimamente a lume continuam a gerar justificadas dúvidas, legítimas apreensões e indeclináveis deveres de denúncia pública, exigência de transparência e rigorosa e previdente assumpção de responsabilidades.



E tudo isto sem desvendar-se ainda os estratégicos mistérios atlânticos da tal rampa dos foguetões e satélites “meteorológicos”, guardados os foguetes, as bombas-foguete e as roqueiras para depois das Eleições (regionais açorianas e norte-americanas...), antes que todas essas estrondosas peças rebentem de novo por cima das nossas cabeças, nas pastagens e debaixo dos solos e aquíferos contaminados, ou no fundo das águas turvas que dissimulada e perigosamente nos cercam, enganam e querem de novo instrumentalizar..., quando não em alegoria adaptada e mais à moda de alguns dos nossos provinciais prestidigitadores, à semelhança de quem ficou (e tornaria a ficar!), como Jefferson dizia da escravatura, com “o lobo pelas orelhas”, naquela aflição ou impasse de permanecer preso “ao cornos do toiro” (ou rabejando-o nas arenas, arraiais e redondéis das ilhas, do país e do mundo), à espera de uma escapadela (ou conjuntural cuspidela...) salvadora – cujo momento propício e seguro dificilmente chegaria para as próximas gerações de açorianos, sempre perdida, adiada ou comprometida a sua multimodal e complexa configuração em hipotecas e concessões inconsequentes e efémeras... Tal como no passado e hoje mais se comprova à saturação própria e alheia:




– Para além, claro, daquelas interesseiras e pseudo-inocentes trocas de nuclear conversa fiada nas ridículas cabeças “decisórias” de certos amadores da “coisa pública”, ignorantes impreparados ou rematados irresponsáveis a quem, rotineira e comodamente, vamos dando um irreflectido voto, passando-lhes míopes procurações...


E nem será preciso, para já – parece-me... – esmiuçar toda uma série de curiosas, sintomáticas e imaginativas propostas e sugestões de alguns encartados analistas, comentadores e “especialistas” que, a partir dos seus semanais poisos e mediáticos estúdios, continuam a debitar incríveis e floridas doses de denunciada publicidade “científica” segundo consabidas escolinhas de propaganda e outros ressabiados discursos (afinal enganosos lugares comuns...) de certos “think-tanks” bélicos – tão prenhes sempre de sub-reptícia (e apenas dita pura e generosa...) intenção de “investigação” –, todavia logo a emparceirar com supostos modelos de alternativos (?) e exequíveis (?) projectos geoestratégicos cuja solidez, segurança e real interesse (local, nacional e regional) é bastante duvidoso e incoerente, quiçá chegando a identicamente violar aqueles mesmos princípios acima partilhados!


– Assim, na rampa destes delírios tácticos, concessões e trocas, o silêncio político-partidário de todos, é ainda mais inadmissível e arrepiante!