Protelações e Definhamento
de um Projecto Democrático
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Muitas têm sido as análises
feitas aos principais acontecimentos que pautaram a vida nacional e regional na
semana finda, com natural destaque para as eleições açorianas e para os
desaguisados relativos ao Orçamento de Estado, à política social (pensões) e às
orientações e defensivas opções governamentais
“socialistas” em áreas programáticas, ético-políticas, morais,
técnico-profissionais e (até) político-comportamentais e argumentativas (como
nos incríveis casos do turismo
futebolístico à conta da Galp e nos astronómicos
salários da CGD, que Costa acaba de justificar e abonar neoliberalmente com
o mercado bancário...).
– Sobre as eleições regionais
quase tudo o que valia a pena e o fruto comentar foi dito, evidentemente no cruzamento proveitoso e no confronto livre de vários testemunhos
locais (v.g. aqueles que o DI e o DA divulgaram, com destaque merecido para uma entrevista a Aranda e Silva no diário
terceirense) e com os que OCS lisboetas e as redes sociais multiplicaram (de
entre os quais se poderiam citar, sem falsos pruridos, pseudo-ofensas
vitimizantes ou apologias, conforme os casos, os artigos e leituras de Eduardo Cintra
Torres (“A abstenção nas eleições dos Açores ronda os 60%. Quem são os
vencedores e vencidos quando seis em cada dez cidadãos não votam?”); Luís
Delgado (“Os Açores são de facto uma região muito complicada, muito pobre,
analfabetismo, insucesso escolar, desemprego. (...) Estamos a falar de uma
região que ao longo de 40 anos não conseguiu dar a volta, não conseguiu criar,
inverter, alterar, mudar a situação de grande pobreza, de grande dificuldade
que existe (...); com tantas dificuldades, tão pobre, tão difícil e tão
espalhada como está, a abstenção é absolutamente normal”), e Vital Moreira (“É
relativamente fácil explicar a continuidade política nas regiões autónomas – só
interrompida nos Açores há vinte anos, com a saída de Mota Amaral – e que tem a
ver sobretudo com o generoso regime financeiro das regiões, que ficam com todas
as receitas fiscais aí geradas, sem terem de contribuir para as despesas gerais
da República (que ficam a cargo dos contribuintes do Continente) e que ainda
gozam de avultadas transferências do orçamento do Estado. Em igualdade de
circunstâncias, os açorianos têm mais rendimento do que no Continente: salário
mínimo mais elevado, pensões mais altas, impostos menos elevados. Nestas circunstâncias,
seria preciso governar muito mal para perder eleições, o que não tem
sido o caso nos últimos vinte anos, para bem dos açorianos”!
Mas no quadro propriamente
partidário – recomendando-se logo aqui o fabuloso
pronunciamento crítico do PCP (“Um resultado [das eleições nos Açores] que
não é separável da intensa campanha de condicionamento eleitoral que, a partir do
governo regional e de todas as estruturas da administração regional, foi
exercida, de uma acção de mistificação sobre a verdadeira situação económica e
social resultantes de duas décadas de governação do PS”) –, nada se perderia em
rever todas as declarações corporativamente
conformadas e acomodatícias, congratulatórias, mistificadores ou apenas auto-justificadoras,
conforme, dos vários actores e agentes deste cenário abstencionista, significativamente em idêntico coro de desresponsabilização (ou passa-culpas) pelo estado comatoso e de inegável agonia democrática a que ingloriamente
chegámos, numa espécie de entropia do
sistema e do regime estabelecidos e da sua correspondente alienação e definhamento societário (social,
cultural, institucional, moral, profissional e ético), tanto por omissão própria como por indução alheia, nas quais e pelas quais
as nossas ilhas dispersas e amorfas comunidades cívicas, desde há muito, sem
excepções notórias, consistentes e consequentes, se tem vindo progressivamente a
afundar.
A nível nacional nada de novo
também, nessa pia incubadora de
sofismas e subterfúgios em que o país continua mergulhado, mais agora com as geringonçadas viabilizações (ditas) de mal
menor ou (feitas) de consentimentos envergonhados
(quando não vergonhosos!) – ainda pelo que cegamente uniformizam hoje e descredibilizam
para amanhã – do BE e do PCP, cada vez mais, na prática sensível, pouco diferenciáveis desse ressabiado
ninheiro de arranjinhos e descaramentos de um PS pequeno-burguês, ambicioso e
dúplice (novamente unanimista “à
Sócrates”?), perante as oscilações tácticas e recorrentes amarras do pretendido
e famigerado “arco da governação” do restante alforge político....
– Ora é neste grave círculo vicioso de penúria mental e de total ausência
de exercício de Cidadania que se aguarda uma improvável transformação de valores e hábitos pessoais e institucionais no próximo Parlamento e na escolha e
entronização do próximo Governo regional, sestro aliás já latente (embora
dissimulado) na corrida aos lugares de
comando (e de oposição ao mando),
enquanto se limpam trunfos e dívidas
para a rodada que se segue nas excelências
e subserviências da Democracia, da Autonomia e dos apregoados critérios
(agendas e complexos...) “de esquerda” (como diz o nosso tão expressivo
ministro das Finanças), temendo-se porém que (inconscientemente?) rumo a um
pior, enganoso e desenganado futuro!
P. S. Já depois de escrito e enviado este texto para publicação nos
jornais “Diário Insular” (versão parcial) e “Diário dos Açores” de hoje (22 de
Outubro), e bem assim nas Páginas Digitais da RTP-Açores (Comentadores) e
“Azores Digital”, leio um artigo de Henrique Raposo, no “Expresso” (edição
on-line), intitulado “Que liberdade pode haver nos Açores?”. Nele o autor deixa
pertinentes constatações e interrogações,
assim salientes na citação que segue:
– “Quase 10% da população açoriana depende do Rendimento Mínimo de
Inserção. Há aqui qualquer coisa de errado. E o erro está na forma como o poder
político aprisiona a sociedade. (...) Se adicionarmos aos 10% de dependentes do
RSI os números da juventude ‘nem nem’, dos funcionários públicos e dos
reformados, das empresas dependentes dos subsídios do governo autónomo e das
empresas estatais, ficamos com um retrato distópico. Que liberdade pode existir
numa sociedade tão controlada pelo poder político? Ou será que o poder político
dos Açores vê nesta dependência uma utopia? (...) Que sociedade civil pode
existir num contexto de total dependência do Estado?”.
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RTP-Açores:
e Azores Digital:
http://www.azoresdigital.com/colunistas/ver.php?id=3203.
Outra versão em “Diário Insular” (Angra do Heroísmo, 22.10.2016):
Outra versão em “Diário Insular” (Angra do Heroísmo, 22.10.2016):