Os brasidos de Fahrenheit
451
Nascido
no Illinois, em 1920, mas cedo tendo ido residir para Los Angeles, faleceu na
passada semana o escritor norte-americano Ray Douglas Bradbury, autor de uma
vastíssima obra – quase toda reunida em edições antológicas – e que inclui
novelas, contos, peças de teatro, radiofónicas e televisivas, literatura
infantil e ensaios sobre cultura, política e comunicação, além de adaptações cinematográficas
nas quais participou como argumentista/guionista (nomeadamente do Moby Dick de John Huston, no Alfred Hitchcock Show ou em Twilight Zone de Rod Sterling).
Filho de
uma imigrante sueca e de um guarda-fios, Ray Bradbury – que se estreou na escrita ainda bastante novo, com a
publicação de pequenos contos em revistas – manteve desde muito jovem um
estreito e intenso contacto com a leitura e com a literatura, especialmente
romances de aventura e ficção científica
Todavia,
de entre as suas obras, maior notoriedade ganharam as famosas Crónicas Marcianas (1950) – que ele
preferiu catalogar como de literatura
fantástica – e a muito consagrada novela distópica Fahrenheit 451 (1953) – que o próprio entendeu classificar como
sendo uma obra de ficção científica
mas “baseada na realidade”, e que viria depois a ser passada ao cinema (por
François Truffaut, em 1966) e encenada como ópera (em 1988).
–
Apaixonado por Livros, Mitologia, História e inspiradoras Bibliotecas, mas sem
nunca ter podido frequentar estudos superiores devido a dificuldades
económicas, Ray Bradbury foi um escritor dotado de particular sensibilidade
para as problemáticas da comunicação
social, da partilha da informação
e da liberdade de expressão, logo
antecipando e denunciando, no que se aproxima de George Orwell e Aldous Huxley,
muitas das questões críticas, ideológicas, político-militares e
técnico-científicas que atravessaram a América da era McCarthy e que hoje
povoam globalmente todos os universos mediáticos, virtuais, psicossociais e
comportamentais do planeta.
Traduzido
por Mário Henrique Leiria, com capa de Lima de Freitas, para a primeira edição
portuguesa – que me recordo de ter adquirido na nossa saudosa Cooperativa
“Sextante” –, Fahrenheit 451 – “the
temperature at which book paper catches fire and burns” – constitui ainda agora (dir-se-ia até especialmente
hoje!) uma assombrosa narrativa visionária sobre os perigos da repressão da Palavra e do Pensamento, da alienação unidimensional das Linguagens
– como filosoficamente foi muito bem analisado por Herbert Marcuse –, da totalitária e violenta destruição da
Memória e dos valores espirituais das grandes Civilizações, em paradigmáticas fogueiras censórias e inquisitoriais,
ou na incendiária aniquilação concentracionária das consciências…
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Publicado em “Diário dos Açores”
(17.06.2012): http://www.diariodosacores.pt/n/index.php/opiniao/1564-os-brasidos-de-fahrenheit-451;
“Diário Insular”
(16.06.2012): http://www.diarioinsular.com/;
Azores Digital: http://www.azoresdigital.com/ler.php?id=2237&tipo=col;
e Os Sinais da Escrita: http://sinaisdaescrita.blogspot.pt/.