As Filosofias de V. Gaspar
Numa muito significativa
Entrevista concedida no passado mês de Abril ao programa “Sociedade das Nações”
(transmitido e conduzido na SIC pelo politólogo Nuno Rogeiro e pelo jornalista
Martim Cabral), Vítor Gaspar – antigo ministro das Finanças do já então periclitante governo do PSD/CDS-PP
(e dos ainda actuais líderes daqueles
partidos, Passos Coelho e Paulo Portas) – desenvolveu todo um notável e pouco
vulgar (conquanto não totalmente surpreendente…) discurso técnico, político-económico,
cultural e pontualmente filosófico, cujos vários conteúdos argumentativos (mais ou menos retóricos…), conquanto incidindo
em especial sobre Economia (especialidade académica, área profissional e
pelouro da sua entretanto demitida governança), em muito ultrapassaram os cingidos
horizontes daquela ciência social e também o vulgar arrazoado (lugares comuns,
frases feitas e chavões) da gíria quotidianamente papagueada nos espaços
públicos (nacionais, regionais e locais!), sem real domínio da matéria falada,
pela maior parte da baixa classe
político-partidária que vem conduzindo o nosso País, há décadas, para ruínas de
soberania e dívidas soberanas, ambas
historicamente suicidárias e de dramático sacrifício para as futuras gerações!
– Todavia e para além do mais,
aquele diálogo televisivo constituiu excelente documentário sobre o entendimento e as estratégias
teórico-práticas que V. Gaspar liderava e vinha fazendo assumir pela
coligação de centro-direita no poder, embora, pelos vistos e pelo menos parcialmente,
nem ele tenha hoje as mesmas ideias, certezas ou esperanças sobre as ditas e
conjugadas crises europeias e nacionais;
sobre o corrente (e não sabemos até quando, nem em que moldes, vigente) programa de assistência financeira e de tutela político-económica ao nosso País,
e – enfim – sobre as perspectivas de austeridade
e consolidação orçamental que
Portugal e os restantes Estados da zona euro enfrentam a curto, médio e longo
prazo…
E é assim que, tanto apesar de, como, precisamente, por essa mesma qualidade, aquele
testemunho do ex-ministro das Finanças continua a merecer ser visto e muito mais detalhadamente analisado do que surpreendentemente o
(não) foi em nenhum órgão da lusa praça e dos seus estafados, oficiais ou
oficiosos lugares de “comentário”…, – desde as inefáveis congeminações
palpitantes (supostamente sempre doutas, argutas e objectivas!) do prof. Marcelo,
às expeditas previsões/anúncios premonitórios de M. Mendes, ou à desfaçatez canalizada
do reencenado poiso do J. Sócrates (com as suas respectivas, ressabiadas ou serôdias
refutações, obscuros ressentimentos e desmemoriados arroubos tácticos
“socialistas”, dos quais, aliás, um PS minado e reincidente foi, é, e tornará a
ser primeira vítima culpada)!
– Mas seja como for, verdade é
que aquele debate é mesmo digno de ser visionado por todos e por tudo o que
revela, oculta ou dissimula daquilo que, à oscilante beira do embuste ou da
patética e improvisada (des)informação, não há muito, se tentou fazer circular por
entre moedas verdadeiras e patacos falsos!
Porém, se quanto ao (in)sucesso autoconfessado da política económica e social do governo – que
naquele ministro teve um dos seus mais plenipotenciários e cimeiros oficiantes encartados
– estaremos entendidos, restar-nos-ia ainda curiosamente rever as sintomáticas declarações e cruzadas cartilhas –
imagine-se! – da teoria económica e financeira (Michael Mussa, Walter Bagehof e
Nouriel Roubini…), da familiar (?) literatura filosófica (Habermas e Foucault…)
e da música barroca (a ópera Ariodante,
de Haendel…), – (todas) citadas e com as quais o nosso intelectual ministro demissionário
tanto fidedignamente confessou amiúde
conviver…, pesem evidentemente os lapsos ou imprecisões (como aquela, por
ele inventada, história de um suposto “debate” em Berkeley – que de facto nunca
chegou sequer a existir… – entre os autores de O Discurso Filosófico da Modernidade e de O Governo de Si e dos Outros, para além, segundo esteve também apenas previsto, de Charles Taylor,
Rorty, H. Dreyfus e Paul Rabinow, em 1984, ano da própria morte de Foucault...)!
– Contudo e mesmo assim, por
entre pistas e despistes que à nossa volta se teceu e entretecem de novo, talvez
que com isso compreendamos melhor a agenda perdida, aleijada e alijada de V.
Gaspar, farto e desencantado das alegadas omissões e tergiversações do meio caudilho
que hoje é Passos Coelho (para demérito do saudoso partido de Sá Carneiro), e
do outro, esse pequeno dândi feirante que é Portas (politicamente travestido e
empolado no que lhe falta de credibilidade até para réplica menor de um passional e
ambicioso condottieri…),
deslustrado ou mal disfarçado embaraço que se tornou ele próprio para um
atordoado e amordaçado CDS (que já foi de Adelino Amaro da Costa e Adriano
Moreira…)!
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Publicado em Azores Digital: