As Dívidas e as Remissões
Conforme previsto, realizou-se no
passado dia 11 em Lisboa, na Faculdade de Ciências Humanas da Universidade
Católica (FCH-UCP), uma Mesa-Redonda, subordinada ao pertinente e actual tema
“Dívida e Perdão”.
Organizada e promovida pela Área Científica de Filosofia da FCH-UCP – sob a empenhada
e competente coordenação de Américo Pereira, Maria Inês Bolinhas e Cecília
Tomás (moderadora na transmissão vídeo) –, esta Conferência, que
suscitou grande adesão presencial e acompanhamento on-line à distância em
Portugal e no Brasil, no sentido de procurar confrontar
e integrar diversas abordagens daquela problemática numa perspectiva interdisciplinar, contou com as participações de Mendo Henriques, António Cortês, Vítor Bento, Jerónimo
Trigo e César das Neves:
– E foi assim que a referida temática acabou por ser analisada
e debatida de modo singular neste fórum aberto, ou não fossem diversas, e por vezes até bem antagónicas, como então ali ficou claramente
evidenciado (ou escamoteado!), algumas das mais conhecidas posições
teórico-críticas (abstractas e concretas…) habitualmente assumidas e
defendidas pelos Conferencistas presentes e academicamente oriundos das áreas
da Economia, Direito, Teologia e Filosofia.
No entanto, apesar da amplitude esboçada nas abalizadas
e respectivas exposições, parece que aquele proposto assunto da Dívida (e do
seu “Perdão”) mais devia ter suscitado
também um outro aprofundamento fundamental
e fundamentado da questão da Culpa
pela contracção da dita…
– Aliás, mesmo que (intencional
ou provisoriamente?) tivesse sido possível retirar dali a questão moral (ou ética) da “culpa” – individualmente perspectivável,
e não como qualquer, outro e diferente, mal
metafísico original que fosse… –, restaria sempre e ainda um natural imperativo de tematização do apuramento da responsabilidade (sócio-jurídico,
política, técnica, estrutural, económica e financeira) e das implicadas e inerentes causas, pressupostos,
processos e factores reais (e realistas!) da contracção mais ou menos (in)conscientemente
deliberada ou induzida (quando não mesmo objectivamente especulativa, usurária, fraudulenta
e criminosa) da visada dívida nossa e
da Dívida enquanto fenómeno genérico, como muito bem tentaram
apontar alguns dos oradores.
Porém, tanto quanto se constatou,
nenhum destes níveis foi ali muito enfrentado, tal como não o foi o problema da “culpabilidade” ou da
“culpa” (e também o da sanção propriamente penal…),
ao contrário do que vem acontecendo, na penalizadora
realidade da crise empírica e
quotidiana dos portugueses, com o imposto pagamento
comum (digo, pelo Bem Comum, ou – talvez melhor – pelo sistémico mal comum…) e o tutelado resgate colectivo do
mesmo endividamento, dito globalmente “nacional”, por parte (tantas e bastas vezes pouco equitativa) de todo o País…
– De resto, tanto à luz do
Direito quanto à sombra de um (outro) manto
desresponsabilizante, ou de indistinta
retribuição tácita – apenas qualificável como Perdão ou Solidariedade por
mor de branqueamentos nacionais ou de equidades internacionais dúbias… –, como
é que seria moralmente legítimo, ou
sequer politico-económicamente justificável,
perdoar uma dívida nacional soberana (como
a portuguesa) sem um apuramento prévio
de imputações jurídico-políticas (ou
até jurídico-penais!), estruturais, pessoais
e especificamente grupais (partidos e programas políticos, grupos económicos, quadrilhas
financeiras, etc.), e sem que antes se consumasse uma espécie de kantiana Crítica da Responsabilidade Impura, ou da
Dívida (supostamente) Pura, – a única propedêutica social que talvez pudesse, com Verdade então, ao menos
fazer consensual e pacificamente aceitar a partilha
dos sacrifícios desta crise, mobilizando então consensual e credivelmente o
País para a construção real de um futuro com sentido minimamente promissor
e digno para as gerações futuras?
E isto deixando de parte a utopia religiosa ou a esperança messiânica (mais próprias
ambas dos frutos e obras de um fraternal e festivo Império do Espírito Santo…)!
– Mas certamente que, para a
necessária e urgente reflexão sobre este vasto e plurifacetado tema, a
Filosofia (política, moral e económica) muito tem ainda a contribuir, ajudando
a mais criticamente pensar para melhor agir, como de novo na nossa UCP exemplarmente o revelaram
Mendo Henriques, António Cortês, Vítor Bento e até, na singeleza quase
extemporânea (intemporal?) do seu humilde discurso evangélico, o Padre Jerónimo
Trigo, – todos eles, como propunha o ali a propósito citado Bernard Lonergan, afinal
atentos àquela única comunidade de responsabilidade espiritual e
personalista, que firma a Palavra, a Liberdade, a Justiça, a Ética, o Trabalho,
a Cultura, a Tradição e a Igualdade essencial de todos homens numa Antropologia
não cínica, generosa, compassiva e – enfim, por isso mesmo – autenticamente
Cristã.
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Publicado em Azores Digital:
Publicado em Azores Digital:
RTP-Açores:
e Jornal “Diário dos Açores” (Ponta Delgada).
Outra versão em “Diário Insular” (Angra do Heroísmo,
14.09.2013).