Retórica e Responsabilidade Política
A semana que agora termina foi
grandemente marcada pela realização das Eleições Autárquicas e por toda uma
subsequente série de exames sobre os seus já mais ou menos previsíveis resultados – embora com relativas surpresas pontuais e globais…
–, multiplicando-se assim e depois, em todos os OCS nacionais, regionais e
locais, como é habitual, as mais díspares e retóricas conjugações de juízos,
avaliações, balanços e (des)culpabilizações sobre os respectivos desenlaces – venturosos
uns, desastrosos outros –, conforme as bitolas partidárias, os interesses
pessoais e corporativos, e os mecanismos de (auto)imunidade e impunidade institucionais
em jogo!
– E foi por esta mesma lacuna fundamental
que a maior parte das vezes aquilo a que assistimos, como se de reais observações
compreensivas (mesmo que não
tendencialmente sequer explicativas …)
se tratasse, foi a um mero exercício, mais ou menos formal ou abstracto (meras
suposições ou equações cenaristas, afinal…), de outras condicionantes, outros
comportamentos, reflexos e atitudes, e outras
determinantes sociais, psicológicas, culturais e informativas, estas então própria,
concreta e situadamente da ordem (mais
observante e objectiva!) da filosofia, da sociologia, da economia e da
fenomenologia políticas!
Ora tudo isto naturalmente que
haveria de ter feito relativizar, embora não anulasse totalmente, os méritos ou
os deméritos de certos resultados alcançados, quando ou porque não apenas, nem
principalmente, devidos a convencimentos ou exemplaridades do carácter ético-politicamente provado ou
da imagem pessoal, imaginada ou
artificialmente construída, de candidatos nascidos das forjas e alforges
partidários (aliás ao contrário, nesta vertente, do que aconteceu com alguns dos
meritórios movimentos e mobilizações de muitos agora ditos ou feitos
independentes…).
– De resto, neste rescaldo das
nossas Autárquicas, não faltaram também testemunhos e propostas que
despudoradamente raiaram a mais surrealista leitura, ou um despudorado e
patético desfasamento político-esquizóide da realidade – veja-se os afoitos
(des)nivelamentos de alguns líderes institucionais, de soberania e partidarite
aguda… –, a par de ilibações e outras desresponsabilizações de faixas
crescentes de tanto eleitorado absorto, falho da percepção fundamentada de
objectivos e valores sólidos, – ao contrário, por exemplo, das firmes posições
de crescentes extractos da sociedade civil e de tantos eleitores (à esquerda, ao
centro e à direita)…
Neste sentido – e tendo em atenção
alguns dos fenómenos novos que as últimas eleições e as opções e resultados deles
saídos atestaram, como justamente acaba de salientar o IDP (Instituto da
Democracia Portuguesa) – é de facto imperioso ver neles e nelas uma forma
“ordenada e consistente” de repúdio da “alternância partidocrática em que
degenerou a democracia portuguesa”, tanto mais quanto ali fica sinalizado ainda
que, não bastando contar com “grupos de cidadãos’ para a “reforma do sistema
político”, é também necessário proceder já a “uma restauração dos partidos
existentes, do seu modo de liderança e recrutamento, por forma a dar expressão
a interesses de grandes grupos populacionais e não de cliques dirigentes”!
– Em todo o caso, agora que foram
(mal ou bem, veremos depois…) eleitos novos (e velhos, ou apenas remoçados…)
governantes autárquicos, mesmo quando as nossas comunidades possam ser
consideradas menos democraticamente preparadas,
ou em estado de menoridade de consciência
e submissão de vontades (segundo parâmetros objectivos de livre e justa existência
societária e personalista, obviamente), como escrevia Julien Freund – é sempre
aos agentes e actores políticos que caberá, enquanto ocupantes transitórios de
um poder democraticamente instituído
mas parcialmente delegado, a
principal assumpção das decorrentes responsabilidades,
pelo que o mais que se pode dizer aqui, no que concerne a colectividade,
enquanto comunidade de eleitores, é
que, também ela há-de suportar essa responsabilidade na medida em que primeiramente,
ela própria, é que sofrerá “a consequência das decisões inábeis ou más dos seus
governantes” escolhidos…
______________
Em “Diário dos Açores” (Ponta Delgada, 05.10.2013);
Azores Digital:
e RTP-Açores:
http://tv2.rtp.pt/acores/index.php?headline=14&visual=10.
http://tv2.rtp.pt/acores/index.php?headline=14&visual=10.
Outra versão: Escolhas e Responsabilidades,
em «Diário Insular» (Angra do Heroísmo, 05.10.2013).