sexta-feira, maio 09, 2014


As Malhas da Fundação

1. Em texto anterior salientámos que a renúncia de Miguel Monjardino ao desempenho de Curador da Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento (FLAD) havia gerado não só grande curiosidade e expectativa, quanto tivera o condão de fazer levantar algumas pontas, véus, capas e aventais com que em misteriosos gabinetes, corredores, galerias e emblemáticos capitais daquela Fundação, desde há muito tempo, vem tecendo estratégicas molduras e bons préstimos...

– O tema mais continua ainda a interessar aos Açores, como foi dito, porque, tal como Mário Mesquita (que lá permanece, segunda consta, por insistência do Governo regional...), Miguel Monjardino é açoriano, e ainda porque, sendo conhecidas as qualidades e diplomáticas afinidades deste conhecido e mediático terceirense (a par, evidentemente, da sua honorabilidade pessoal e qualificação intelectual indiscutíveis, conforme acentuei!), o seu inesperado afastamento da FLAD pode estar relacionado com factos e outras supostas coincidências – alegadamente não envolvendo directamente os Açores – mas verosimilmente reflectindo uma situação interna da Fundação que é marcada por uma série de nebulosas, intrigas, armadilhas, subtis ratoeiras e já indisfarçáveis conflitos...



2. Ora a FLAD é uma “instituição portuguesa”, “de direito privado” e “financeiramente autónoma”, que tem por missão “contribuir para o desenvolvimento de Portugal através do apoio financeiro e estratégico à cooperação entre a sociedade civil portuguesa e americana”. Criada em 1985, esta Fundação nasceu para promover múltiplas relações Portugal/EUA e foi logo dotada à nascença de cabedais vastos – a partir de um pecúlio inicial (85 Milhões de Euros) constituído “através de transferências monetárias feitas pelo Estado Português e provenientes do Acordo de Cooperação e Defesa entre Portugal e os EUA (1983)”, isto é, fundamentalmente, ao abrigo ou à sombra, da Base das Lajes! –, declarando-se depois a viver, desde 1992, “exclusivamente do rendimento do seu património” e de valores que recentemente reacenderam polémicas à volta de Rui Machete (que a dirigiu durante cerca de 20 anos) e de velhos dissídios gestionários entre tutelares agentes, confrades, sócios, demais parceiros envolvidos e duros desagrados diplomáticos norte-americanos...


Por outro lado ainda, como aqui também comentámos anteriormente, as últimas escolhas para os órgãos sociais da FLAD tornaram-se de imediato uma questão controversa e que se pode resumir, no essencial e no que se refere à posição dos Açores (e de Mário Mesquita e Miguel Monjardino...) – ladeando-se naturalmente o supremo jogo de interesses político-partidários, estratégico-diplomáticos, pessoais e outros que não vem ao caso retomar, por exemplo, as colaterais e putativas acções de várias agências e sociedades, v.g. o Centro Português para a Cooperação (que integrou Marques Mendes, Ângelo Correia, Vasco Rato, Júlio Castro Caldas e outras destacadas figuras do PSD), o IPRI, a Loja maçónica “Mozart”, etc.) –, entre voltas labirínticas e reviravoltas públicas ou de bastidores, do seguinte modo:


– Os Açores pretendiam um representante formal, ou alguém que informalmente assegurasse uma representação efectiva dos Açores no Conselho Executivo da FLAD (onde tinha estado Mário Mesquita), o que não se conseguiu; e foi depois, com o afastamento forçado da ex-ministra socialista Maria de Lurdes Rodrigues (nomeada por José Sócrates) e sua substituição na presidência da FLAD por Vasco Rato (escolha directa de Passos Coelho), que fomos chegando ao imbróglio actual... Porém, dizíamos, no que se refere especificamente aos Açores, o assunto parece ter ficado por ali, gerido com algum cuidado e consenso projectivos por Vasco Rato (tanto em Lisboa como nas reuniões mantidas nos Açores com Vasco Cordeiro, e entre os dois na presença de Mesquita, que aliás mantém, conquanto em piso inferior, um asseado gabinete na Fundação, apesar de ter, ao que o “Expresso” escreveu, sido “dispensado”, “com grande agressividade”, de uma “contribuição mais empenhada na Fundação”...).


3. Ora é neste contexto – que aparenta, pretende dissimular ou simula envolver várias vertentes... – que vem à ribalta de alguns OCS: 1) a renúncia e consequente afastamento de Miguel Monjardino; 2) o despedimento de José Sá Carneiro (agravado com a instauração judicial de um processo disciplinar contra este ex-secretário-geral da FLAD durante a chefia socialista de Lurdes Rodrigues), e 3) a dispensa de uma outra Curadora da Fundação, a conceituada cientista Elvira Fortunato (que se tem pronunciado criticamente em relação à política para a investigação científica imposta pelo governo de Passos Coelho), por alegada “desavença com a novo presidente do Conselho Executivo” da FLAD (Vasco Rato), ainda segundo fontes invocadas por aquele semanário, manifestada “num episódio [...] muito desagradável, desnecessário, inexplicável e institucionalmente incompreensível”!

– Todavia, pese embora alguma deriva acrescida ou compósita inflexão causal, a verdade é que, conforme já havíamos escrito aqui, a FLAD, ao sabor dos novos (des)alinhamentos e agenciamentos político-partidários e governamentais portugueses, luso-americanos e açorianos continua ainda em parto de profundas e controversas recomposições executivas, curadoras, técnicas e individualmente representativas, quase todas e todos afigurando-se ali pouco claros e justificados, sabe-se lá se numa série em crescendo de (des)acertos ou (des)ajustes de contas, nos quais os melhores róis, como em ratoeira armadilhada, estarão apenas à espreita de quem os desembrulhe, mordendo a isca (ou atirando-a a mar largo, como o dos Açores, mesmo a calhar...), para desvio na rota das malhas gradas de outras redes, das quais o peixe mais pequeno, previdente e ágil, ter-se-á estrategicamente escapulido a tempo e antes que a embarcação adorne!



Finalmente, enquanto tudo isto continua a arrastar-se, ameaçando atingir proporções maiores a diversos níveis institucionais, administrativos e diplomáticos, é sabido que Vasco Rato (acompanhado de Jorge da Silva Gabriel, seu braço direito na FLAD) foi entretanto recebido pelo Presidente da República (todavia intrigantemente sem a presença de Michael Baum, membro do conselho de administração indicado pela Embaixada dos EUA...), sendo mais que certo ter Cavaco Silva querido inteirar-se de toda esta conflitual situação, a qual – para além dos Açores – imbrica na complexa e delicada rede global das relações luso-americanas, de onde a nossa Região não pode nem deve deixar que a ponham à margem, apenas servindo para dar cobertura – de corpo presente, boca calada e olhos fechados? – sabe-se lá a quê e para quê, afinal... 
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Em "Diário Insular" (Angra do Heroísmo, 11.05.2014):






















e Azores Digital":
http://www.azoresdigital.com/colunistas/ver.php?id=2624: