Regressões e Retóricas Radicais
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1. Precisamente
há dois anos – quando Vasco Cordeiro recebeu um “Relatório”, o famoso e patético relambório (1) da Praia da Vitória (aqui
analisado em 30.01.2013) sobre as colisões
da presença americana na Base das Lajes,
– e quando na altura ouvimos ser afiançado, quase afrontosamente para os
pequenos (dos) Açores, pela melíflua e soberana autoridade político-militar e
diplomática nacional do ministro Aguiar Branco, que as relações Portugal-EUA
(como se isso fosse novidade táctica ou estratégia actual de Lisboa…) iam muito
para além dos doirados “peanuts” do Campo das Lajes –, publiquei também aqui
(2) (13.01.2013) uma
Crónica (“As Lajes em Fogos de Alto”) onde eram feitas ponderações sobre uma
Nota-Esclarecimento oficial (3)
do Governo Regional dos Açores (GRA) na qual eram desmentidas e corrigidas afirmações do presidente da autarquia
praiense, – entendendo aí formalmente o GRA ser “útil e necessário esclarecer”,
por ser falso e contrário ao referido pelo
autarca local, que um (na altura muito apregoado) “interesse” de empresários pela
Terceira resultasse “do trabalho
desenvolvido” pelo chefe do executivo regional nos USA, onde fizera contactos “no
sentido de encontrar soluções” que minimizassem “o impacto da redução militar”
na Base das Lajes.
– E
depois, porque aquele edil alegara que tal informação lhe fora “transmitida
pelo próprio presidente”, logo o gabinete de Cordeiro viria acentuar, em
relação à vinda dos tais empresários, ser a dita “uma iniciativa do Governo dos
EUA, promovida pela [sua] Embaixada (...) em conjugação com o Comando Europeu
há já algum tempo”, mais precisando-se que o respectivo programa e actividades tinham
sido trabalhados entre as autoridades
americanas e o GRA, sendo através deste que
fora “promovida a participação das entidades representativas dos empresários da
Ilha Terceira e o Município da Praia da Vitória”!
De
resto este paradigmático episódio, simultaneamente recordatório e premonitório de muita História regional
e nacional, merece ser recordado agora, quando a Praia da Vitória e a sua
actual gestão político-partidária aparecem totalmente vulneráveis, decisoriamente
impotentes, descredibilizadas, quase sem nenhuma miragem de salvaguarda ou
saída “sustentável”, e completamente à margem do que lhe diz respeito (dir-se-ia
direito ao respeito!), como ficou
sobejamente demonstrado com o chamado (e escamoteado...)
“Plano de revitalização” da Terceira, para além de umas esparsas e ridículas bravatas
mediáticas e outras retóricas “radicais” sem consistência...
2. Ora
enquanto tudo isto acontece, por unanimidade, a Câmara Municipal de Angra do
Heroísmo (4) acaba (16.01.2015)
de chegar-se (liderante?) à frente da
batalha terceirense, tomando uma inédita
posição reivindicativa a nível regional, nacional e internacional, mas sem sequer nomear significativamente os Praienses
e – em termos institucionais, económico-sociais, laborais, populacionais e
políticos! – a triste, inócua e destroçada Praia da Vitória, os seus órgãos
autárquicos (mal ou bem ainda formalmente
representativos) e todo aquele Concelho, – áreas geográficas e populacionais
afinal as mais imediatamente próximas
da Base e as mais atingidas pelos impactos previstos, desde há muito previsíveis e presentemente já
consumados.
– Porém
é neste contexto, e já após a divulgação do pronunciamento e frontal
“Deliberação” angrense sobre a redução dos efectivos na Base das Lajes, que nos
chegam ecos das primeiras reacções (reservadas
e cabisbaixas...) ao documento da
autarquia presidida por Álamo Meneses (PS), nomeadamente no que decorre dos
seguintes pontos e passagens relevantes:
“ A Câmara Municipal de
Angra do Heroísmo delibera: “1 – Repudiar veementemente a forma
e o conteúdo da decisão unilateral do Governo dos Estados Unidos da América,
por esta: “a) Prejudicar de forma desproporcionada o Município de Angra do
Heroísmo, onde residem muitos dos 500 trabalhadores que serão despedidos e onde
tem sede a maioria dos agentes económicos direta e indiretamente afetados pela
decisão; (...) d) Ignorar e desconsiderar os fortes impactos que da mesma
resultam para os açorianos, mas muito em particular para os terceirenses,
considerada a redução expectável de 10% na economia da ilha Terceira (...); “2
– Exigir ao Governo dos Açores e ao Governo da República a colocação imediata
ao serviço dos terceirenses de todos os recursos necessários à proporcional
compensação dos efeitos emergentes da decisão norte-americana, (...), no âmbito
de um plano de revitalização económica para a ilha Terceira (...); “3 – Exigir
a imediata reavaliação da presença norte-americana nas Lajes, elaborando um
estudo que de forma transparente permita contabilizar as vantagens e
desvantagens dessa presença, da concessão de facilidades a outros Estados ou
organizações internacionais e a determinação de usos alternativos para aquela
infra-estrutura (...); “5 – Exigir aos norte-americanos que procedam aos
trabalhos de integral remoção do passivo ambiental resultante da sua presença
na Base das Lajes, nomeadamente a descontaminação dos solos e aquíferos da
Praia da Vitória, de forma a garantir a qualidade ambiental pela qual os Açores
são conhecidos e gerar emprego, nomeadamente na área da construção civil; (...)
“7 – Exigir ao Governo da República que os edifícios integrados na Base das
Lajes que serão devolvidos às autoridades portuguesas, (...) sejam imediata e
integralmente entregues ao Governo dos Açores para que possam ser colocados ao
serviço do desenvolvimento económico da ilha Terceira”...
3. Agora,
para além do mais, perante o tal enevoado (e talvez regionalmente bem controverso...)
“Plano de revitalização” da Terceira; face ao Documento angrense, e diante
daquilo que ambos podem traduzir e
veicular, o que se aguarda é uma tomada de posição da Praia da Vitória, apesar
das cada vez mais isoladas e bloqueadas
posições político-partidárias internas e
regionais (ou devido a elas...) em que Roberto Monteiro se deixou cair,
compelindo a “sua” Câmara, o GRA e o próprio PS!
Todavia,
exemplar e realmente radicais (isso sim, e possivelmente
justificadas em toda a linha), seriam atitudes que chegassem à demissão inteira do executivo camarário
na Praia, corajosa e simbólica
atitude esta, no entanto, que não se vislumbra ao alcance das estaturas e estruturas (profundamente
divididas e endividadas...) dos agentes e actores em causa e cena no Ramo
Grande e na Terceira, até porque, messianicamente
à socapa, vão-se já alinhando à mesa o pires
e a chávena para o acre chazinho da
sucessão...
– Mas
para cúmulo deste descalabro sistémico,
com fogos de alto histórica e
ciclicamente recaindo sobre o nosso País e suas vergonhosas imundices e incríveis
sub-mundices institucionais e diplomáticas, só nos faltava a retórica arrogante,
sibilinamente imperial, da afrontosa
Entrevista do embaixador yanquee em
Lisboa (5), como se
Portugal estivesse rastejante – pedinte, apenas (des)armado de arco e flecha ou
de testa no chão... – no Far West, no Mid-East ou colonialmente
regredido ao estádio de tribo e povo berbere, quando não de Estado pária ou
falhado, em plena Europa e no coração do Atlântico.
– Em
todo o caso, o mal (a origem e a derivação) de tudo isto vem de há
décadas, remontando às permanentes contingências
e vicissitudes histórico-políticas, mentais e culturais que sofremos com
maior gravidade relativa e com oscilantes (ir)responsabilidades (6) desde meados do Século
XX até hoje (desde os tácticos ajustes
possíveis das chancelarias de Salazar e Marcello até aos consabidos tropeções de Machete & Cia),
pese embora não poderem aquelas servir de desculpa
ou lenitivo contemporâneo para a menoridade culpável, a preguiça de
pensar, a incoerência no agir e a completa vacuidade e desorientação das actuais
“elites” (ou melhor, dos seus próceres institucionais, representantes de
aluguer “ad hoc”, agentes delegados dos poderes e quejandos actores de
substituição e soberania inferior!), como se tornou a comprovar à evidência
durante a regional semana passada, nos respectivos, dramaticamente mediatizados
e confrangedores fandangos nativos...
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(3) Cf. em:
(4) Texto integral aqui: http://www.cmah.pt/artigos/ver.php?id=1313.
(6) Neste âmbito crítico situe-se, para extensão singular, a
Entrevista de Vasco Cordeiro à RTP, aqui:
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Em "Diário dos Açores" (Ponta Delgada, 20.01.2015):
RTP-Açores:
http://tv2.rtp.pt/acores/index.php?article=38947&visual=9&layout=17&tm=41: