Um patético Relambório
1. Tal como vinha dizendo no DI do passado sábado, é quase
inacreditável o que se lê num patético
relambório sobre a Base das Lajes – verdadeiro, aflitivo e desolador testamento e atestado de mediocridades e
de irresponsabilidades político-institucionais e socioculturais passado à nossa
terra –, de tal modo que só folheando integralmente o dito “Relatório”
(disponível em http://www.azoresdigital.com/relatampv.baselajes.pdf)
será possível avaliá-lo em toda sua objectiva
gravidade e significado profundo!
– Recapitulando: Conforme
deliberação unânime (15.06.2012) da Assembleia Municipal da Praia da Vitória
(AMPV), foi a sua Comissão Permanente (CP) encarregada de elaborar “um
trabalho” para definir a “posição abrangente e, se possível, unânime, dos
Órgãos de Poder Local da Praia da Vitória sobre a Base das Lajes”! E assim foi
logo decidido “realizar audições a várias entidades e personalidades que têm
como área de intervenção e de investigação os assuntos relacionados com a
presença Norte-Americana na Base das Lajes, nas suas diversas vertentes”, –
levando-se depois a cabo (entre 30.07.2012 e 09.11.2012) quatro das ditas
sessões, nas quais participaram, a consabidos e diferentes títulos, as
seguintes personalidades: Armando Mendes, Berto Messias, Emiliana Silva,
Francisco Oliveira, Francisco Tavares, José Adriano Borges de Carvalho, João
Manuel Barcelos, João Ormonde, José Paim, José Parreira, Norberto Messias,
Paula Ramos, Paulo Borges, Paulo Ribeiro, Roberto Monteiro, Rui Castro e Victor
Silva.
– De seguida, após solicitação
(certamente técnica e metodologicamente pensada, adequada, acautelada e
competente…), lá o presidente da CP pediu ao presidente da AMPV que –
sublinhemos aqui … – “disponibilizasse os serviços
de gravação dos (…) trabalhos, para que depois, para efeitos de relatório, pudéssemos ter todas as transcrições, para que possam também constar desse relatório final. Nós definiremos, depois das
audições, quais os procedimentos a
adotar, mas a ideia é, como foi deliberado e definido na última Assembleia
Municipal, que seja elaborado um documento
que será a posição oficial, digamos assim, dos órgãos do poder local da Praia da Vitória, posição essa também
a ser considerada no âmbito de um
processo negocial, que se avizinha, em torno da já anunciada intenção de
redução do contingente estacionado na Base das Lajes” (sic)!
E note-se: – Sem prejuízo da gramática, da ortografia e, evidentemente, da mais marcante e espontânea oralidade (que lá ficaram também gravadas para os anais e actas da nossa melhor literatura democrática e parlamentária…), deve já ser referido que todas as transcrições aqui tomadas (e aquelas que, por pudor, não cito!) reproduzem exactamente o que está publicado no dito “Relatório” institucional, o qual – após as ditas “consultas” e superiormente modelado (pois como não havia de ser?!) sob a sábia orientação da tal CP – foi dado ao conhecimento (?) da AMPV, que o aprovou, a 14.12.2012, por unanimidade reiterada e com a conivente anuência de todos os partidos que lá tem assento parlamentar municipal (como agora se diz)!
Mais tarde, como foi publicitado, da mesma triste crestomatia praiense, foi feita solene e oficial dádiva em mão (11.01.2013) ao presidente do Governo Regional, só não se sabendo, entrementes, quando ou se será a dita e selecta antologia de depoimentos pomposa e formalmente também entregue, como também intencionado pelos seus obreiros, ao próprio Governo da República Portuguesa…
2.
Ora, independentemente daquilo que sobre tal ilustrado rebento municipal terá
de ser posteriormente dito, mas porque se trata de reais imagens e imediatos interesses
nossos (açorianos e portugueses!), não posso deixar de confessar ter sido com
um misto de vergonha e de indignação que li semelhante e suposto “Relatório”,
para mais numa altura histórico-diplomática e com um destino negocial,
estratégico e de soberania que, ainda por cima, lhe pretenderam e pretenderão
dar…
– Bem sei (calculo...) que o dito
“Relatório” não fará propriamente História (embora talvez provoque alguma mossa
conjuntural, ou suscite dobradas e piedosas risotas historicamente humilhantes para todos nós!). Todavia, e para além
disso, que aquelas espantosas letras e folhas hão-de certamente ficar para a
contemporânea história local dos Açores (e de Portugal no seu todo, desde a
mais humilde freguesia à mais científica e distinta Academia…), como um datado
e pequeno monumento (significante na sua insignificância…) à menoridade, à irresponsabilidade e ao nosso comprometedor e degradante retrocesso político, institucional,
social, cultural e mental –, lá disso não haverá a mínima dúvida!
E mais: – Quando o que ali fica
arquivado para a posteridade provém de quem teve, e/ou tem, algumas (grandes e
graves) responsabilidades políticas (e partidárias) na nossa vida colectiva,
por maioria de razão, o caso torna-se sobremaneira preocupante e angustiante,
na exacta medida em que o ultrajante e
incauto conteúdo daquele tão comprometedor, indiscreto, insólito,
confrangedor e patético relambório, somente terá paralelo nas suas quase inacreditáveis formas, (i)literacias e arrojadas pretensões!
Tudo isto, na verdade, é muito
desolador (e seria carnavalesco, se
não fosse dramático). – Porém,
sinceramente, ao fim de todos estes anos (de Democracia, de Autonomia e até de
Escolaridade...), chegarmos a tanto e a tão pouco, é mesmo de partir a alma!
Sem antecipar nada do que crítica
e detalhadamente dir-se-á mais tarde, noutro contexto e no domínio de
abordagens críticas e socio-históricas – que é aquilo que fundamentalmente me
interessa focalizar nesta problemática –, apenas quero hoje adiantar que –
desde a inconcebível e desadequada “metodologia” usada, até à analfabeta
transcrição técnica dos palavreados gravados; desde o embaraçoso e escusado
registo de afirmações (algumas individualmente penalizadoras…), desabafos de
estados viscerais e (até) acusações ultrajantes para o Estado Português, para o
País e para muitas das suas instituições, representantes e órgãos; desde as
mais mirabolantes, desinformadas, superficiais ou apenas levianas análises, até
às mais imprudentes ou inconsequentemente formuladas defesas de
vários dos nossos (esses sim, justos e
razoáveis!) direitos e deveres, –
quase nada do que ali consta abona substancialmente a favor da Praia da
Vitória, da mínima e exigível qualificação
interna e externa dos seus órgãos e actores municipais, políticos e
técnicos, até porque a todos e à nossa terra expõe ao mais alto nível, e mais
do que o imaginável, a um atroz e ridículo estatuto institucional, pessoal,
sociocultural e ético!
– Finalmente, ainda por cima,
ter-se pretendido provocar a chamada
(à pedra, à pedrada ou às lajes do
Poder Local?), para depois, formalmente, perante a sua sensata recusa,
manifestar e fazer inscrever no texto das Conclusões
e Recomendações deste tosco
testamento “praiense” – que permanece aliás e todavia apenas da exclusiva e total responsabilidade
daquela confrangedora, auto-suficiente e comissariada instância municipal! –
que se lamentava “o facto de o Comando Português e Comando Americano da Base
das Lajes terem recusado ser ouvidos”, francamente, nem sequer merece qualquer
comentário…
3.
Tudo isto, como escrevi antes – evidentemente não invalidando o mais importante
que naquelas reuniões, em bruto, foi
dito –, o que se questiona e renovadamente rejeita é acima de tudo o modo impensado, improvisado e presumido
como tudo foi ali congeminado e
depois tombado na rústica (e nem
sequer corrigida…) prosa do suposto
“Relatório”, chegando-se, também com isso, ao ponto de fragilizar e desacreditar o que lá fora eventual, esparsa mas validamente reflectido (ou apenas irreflectidamente desabafado…), na mais
ridícula, leviana e improcedente demonstração
narrativa do nosso subalterno
estatuto regional, nacional e internacional!
E é ainda por estas razões e pela
insuspeitada (?) e revelada desqualificação
técnico-política da CP, da AMPV e da CMPV – que pouco escrupulosa e perigosamente tornaram a deslustrar as
populações que dizem representar, minorando o seu histórico brasão e o seu nome,
e desproporcionadamente comprometendo as suas legítimas expectativas – que, a um preciso nível, toda uma
perplexa, pequena e humilde comunidade local ficará agora ainda mais desiludida e irremediavelmente mais fragilizada no contexto regional e
nacional, sob o olhar pragmático
(calculista, cuidadoso e displicente…) da “real policy” do velho amigo, hóspede
e aliado norte-americano, e daquilo que (de há muito) esta hegemónica potência
vem preparando e consumando sobre tantas das nossas desatentas, ignorantes ou
preguiçosas cabeças de vento…
Desta brincadeira, toda de mau
gosto, com coisas sérias à mistura; deste presente envenenado aos seus próprios
artífices; desta oportunidade perdida; desta ridícula manifestação de
paroquialismo e de incompetência institucional, técnica, política, social e
científica – enfim –, só se aproveitará talvez uma coisa:
– Ficámos todos a saber melhor,
se dúvidas houvesse, caso a caso, a verdade nua e crua daquilo que cada um (nas
semelhanças e nas diferenças manifestadas) pensa, sabe,
diz, vale, descura ou ignora enquanto “representante” municipal praiense,
terceirense e açoriano, líder, mentor político-partidário ou dirigente
associativo e sindical, nestes tristes tempos que correm, sem quase ninguém
autenticamente capaz de olhar pela nossa terra e pela nossa gente, aqui e além,
nas velhas e novas capitais dos impérios
do globo…
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Publicado em “Diário Insular” (Angra do
Heroísmo, 29 de Janeiro de 2013);
RTP-Açores:
http://www.rtp.pt/acores/index.php?article=30722&visual=9&layout=17&tm=41;
Azores Digital:
http://www.azoresdigital.com/ler.php?id=2329&tipo=col.
RTP-Açores:
http://www.rtp.pt/acores/index.php?article=30722&visual=9&layout=17&tm=41;
Azores Digital:
http://www.azoresdigital.com/ler.php?id=2329&tipo=col.