O Silêncio dos Livros
Não fora a ansiosa e passional
interrogação de uma colega professora, recém-chegada à ilha, sobre aonde encontrar Livrarias em Angra do
Heroísmo (formal cidade Património do
Mundo, histórica e proverbialmente dita, ou suposta, passada “capital
cultural” dos Açores, quando não apenas provecto areópago intelectual das ilhas
“de Baixo”…), e talvez esta Crónica não tivesse o rumo deste sugerido tema para
os primeiros dias de Verão, quando toda aquela urbe e suas periferias fervilham
já nas tradicionais e arreigadas galas das suas frenéticas ondas e sonhados
luares de emoções festivas, – mais ou menos efémeras
umas, menos ou mais imaginários os nobres
restos do seu emblemático brasão, para real ou somente retórico ofício e dever
de identidades narrativas ou icónicas…
Todavia, nesta quadra estival, indiferenciada
e recorrentemente sentida como mais propícia a parentéticas e poéticas rêveries – ou como velha e modorrenta
“estação calmosa”, por entre depressivas crises, (des)compensatórias idas ou
vindas a banhos e praias, festivais, touradas e tasquinhas, pontuais mobilidades,
roteiros e rotações de alienadas centralidades inter-ilhas, devaneios de
turismo e outras viagens, por aí fora e dentro, longe ou ao pé da porta … –, a pergunta daquela universitária não
deixou de ter logo a possível e primeira bússola com a sinalização da nossa
presentemente mais cultivada e informada Livraria angrense (a “In Folio”) – lugar de culto –, como a sua empenhada responsável
justamente testemunhava ao DN, e aonde
os livros (e alguma Música), em mansa companhia da Branca de Neve, “não são para as elites
do dinheiro, daquela com sinais exteriores de riqueza ou tontice, mas para a
elite do pensamento, cultura, arte, beleza do espírito humano e da humanidade”!
Depois
– distantes e idos os tempos do “Andrade”, dos escassos Alfarrabistas, da
Livraria particular de Ferreira dos Santos, da saudosa “Sextante” e da
fraternal Papelaria "Académica" de Emílio Ribeiro –, para além dos esparsos escaparates
hodiernos e magazinescos dos quiosques, tabacarias e mercados locais –, o desejado
percurso habitual de hoje poderia fazer-se ainda por esses outros sítios que
aqui ainda disponibilizam, dando-lhes mostra e montra, variegadas capas e díspares
edições: “Loja do Adriano”, “Utilidades”, “Católica”, DRC, Museu e IAC, sem
esquecer a apelativa Feira do Livro
que este ano a micaelense “Tabacaria Açoriana”, em boa hora, trouxe à circunscrita
atenção e ao interesse de uns tantos terceirenses…
– Porém, e se para alguns – residentes e visitantes, iguais leitores por virtude e hábito –, as Sanjoaninas deixassem mesmo intocado o mais genuíno espírito da Leitura incarnado naquela atitude de vida interior que o consagrado autor das Confissões tanto admirava no seu sapiente mestre de Milão, quando o via ler e “os seus olhos esquadrinhavam a página e o seu coração procurava o sentido, mas a sua voz não se movia. Qualquer pessoa podia [então] chegar até ele livremente e as visitas não eram normalmente anunciadas, de forma que, muitas vezes (…), encontrávamo-lo (…) assim, em silêncio”?
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Em RTP-Açores:
Azores Digital:
“Diário Insular” (Angra do Heroísmo, 22.06.2013),
e “Diário dos Açores” (Ponta Delgada, 23.06.2013).