Os Farsantes e a Urna
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Não há nada mais propício a boas farsas sociais do que as Campanhas Eleitorais
tal como as conhecemos, vimos, vivemos já, ouvimos contar e lemos desde Mestre
Gil a Saramago...
– E assim é um nunca visto rol de
gestos de simpatia; afectos vindo à flor da pele e dos tambores da banda;
interesses por causas e injustiças de séculos, ou de há semanas apenas; insólitas
ternuras para com velhinhos, crianças e pobres; compunção perante injustiças e
misérias; assomos e afiançamentos de moralização; denúncia ou remédios
prometidos para situações clamorosas, e – claro – tudo isto a par de retóricas e
compromissos (sem réstia de possibilidade de garantia, evidentemente, portanto,
“portanto”, como declama um actual agente da educação ilhoa, enquanto empeça no
peixe que vai vendendo), porém tudo numa roda viva por auditórios, cantinas,
ruas e arruadas, comícios, jantares e almoços, buzinadas, visitas a feiras,
mercados, academias, empresas e empresários de sucesso (à mistura com falidos, à
espera de subsídios ou adjudicações), e autarquias também, e câmaras de
comércio, indústrias e serviços; e logo a dignitários, caciques, servos e
bandoleiros político-partidários, e a senhores eclesiásticos de batina e venal
cabeça (ou sem cabeção para perfeita e moderníssima secularização), e etc. por
aí fora, cantando, dançando e rindo em folia
“democrática” (ritual imenso de
“participação cívica”!), com líderes, populaça e popularuchas adesões à causa pública e ao invocado “bem comum”,
todavia contando-se pelos dedos as excepções, como aos dedinhos das mãos em cantilena
(para enganar incautos ou adormecer catraias, mentecaptos ou incultos e
anjinhos...), desde o dedo mindinho
da lista das primas-donzelas e seus varões candidatos, até ao controleiro do mata-piolho, passando pelos vizinhos do aparelho, pelo grande pai de todos e pelo para-todo-o-terreno
do fura-bolos (que dele melhor até se
diria penetrante fura-olhos e fura-vidas), quando para outros e
maiores talentos e validades não prestariam nenhuns, nem a tanto se deram
nunca, nem hoje valem, – neste reciclado tempo de lixos e papéis de falsários na mesma urna!
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Em "Diário Insular",
Angra do Heroísmo, 26.09.2015: