Os Aventais e a Tanga
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A recente realização de um grande
evento da Maçonaria portuguesa, promovido e organizado pelo Centro de Estudos
Maçónicos, com o suporte da Câmara Municipal e da Cooperativa Cultural da Praia
da Vitória, constitui feito digno de registo por tudo o que significou,
revela e
esconde, para mais tendo-se em conta a
atenção e cobertura que granjeou (ou não...) nas Redes e OCS
, as reacções que provocou
nos cidadãos e nas instituições, e as análises que (des)motivou do ponto de
vista político-cultural, filosófico, ético, ideológico, cívico e
socio-histórico na colectividade local (de resto mais fadada e aparelhável para
a tanga do que para
o avental)!

– Ora tal certame, variante de cimeira inter-pares, tendências e lojas (ainda para doutrinação,
aliança e propaganda), como fora habilmente pretendido e ficou à vista de
quantos não andam por cá de olhos
vendados, apesar de a muitos dos organizadores, patrocinadores e simulados
“compagnons de route”, provavelmente ornados de meias viseiras ou antolhos para
vesgos aprendizes de rito e ideários da dita “sociedade secreta”, talvez lhes
terem, em dia solar, ilusoriamente
soado badaladas de distante consciência
em afinados sinos e tinos de intenção programática,
se é que não foram, em noite de quarto escuro, sem lua na faixa ou na martelada
do almofariz limpo, sujeitos a investiduras
de luva, com toda a dimensão “iniciática”
que cartilhas, juras e compassos debitam, e a “irmandade” depois se encarregará
de cobrar para “o bem e o progresso da humanidade”, sob o olho vigilante do
supremo arquitecto...

Porém, por entre tanta hipócrita
e cínica
maçãzinha escondida nesse
cesto e toca de
secretismo e poder de
seita – vantagens à parte nos comércios e tráficos de almas, corpos e influências...
–, o mais
espantoso e repugnante é o
podre silêncio, mais ou menos pacóvio,
comodista, cobarde, levianamente
cúmplice
ou apenas
acéfalo de toda uma
outra comunidade e suas
instituições e organismos historicamente
relevantes e responsáveis – incluindo a
Igreja
com
os seus clérigos tão catequizantes e zelosos, pastores e pastoralistas,
“teólogos” e leigos “empenhados”, ou (des)comprometidos nos
bons combates ideológicos, morais e
práticos (e certamente não por falta de
doutrinas
claras), conquanto às vezes aparentemente
ignorados ou esquecidos... –, hoje cada vez mais
reduzidos e
decadentes em expressão fútil, indefinida, nula ou oca (estulta e
até amiúde
paganizada nalguns casos),
para além da
objectiva traição de uns
banais “académicos”, inocentes úteis ou débeis “intelectuais” (que os há por aí,
mesmo que
semicultos e
encanastrados), e de certos líderes,
agentes e actores políticos (que nadam, pululam e nidificam rotineira e
instaladamente como
parasitas e camaleões
em pântano, com as suas
moscas partidárias
à ilharga do umbigo ou das orelhas...).

– De resto, como já tive ocasião
de referir aqui mesmo em 2011 e 2012
, num cenário não
muito diferente (e de certa maneira
antecipatório
do actual...), com notoriedade mediática mereceram assim, agora novamente nos
últimos dias, a Maçonaria portuguesa e a Política lusa, conjugadamente, uma
significativa, ampla e desusada abordagem, à qual não faltaram muitos dos
atraentes
motivos e ingredientes que
sempre estiveram, e ainda estão, associados àquela aureolada instituição e
àquele decisivo (e decisório…) domínio da vida do País.
E depois não deixa – talvez, mas
apenas à primeira vista… – de causar alguma estranheza o facto de ser precisamente
nesta época de crises generalizadas
que entre nós esse tema tenha sido trazido, da
forma como o foi, ao espaço, à divulgação e ao conhecimento da opinião
pública, curiosa e até potencialmente cativante, tanto mais quanto isso mesmo
foi efectivado com a precisa, minuciosa e planeada revelação doseada (parcial!)
de alguns documentados e ilustrados pormenores (afinal, nem sequer tão secretos
ou reservados como se poderá ter querido fazer parecer) da história, génese,
características, ritualidades, simbologias e práticas daquela instituição e
dita “sociedade secreta”, que assim e por este meio viu provavelmente mais
polidas e potencialmente levantadas algumas
das suas novas e pretendidas colunas
unidas...

No entretanto, e para além
daqueles sucintos dados, o que mais acentuadamente terá motivado muita da
referida e conseguida oferta e procura de tão rentável produto foi certamente o
rol de meia dúzia de nomes dos ditos
“irmãos”
bem (des)aparecidos (
alguns porém
fugindo àquela praiana mesa e plateia da família...) como pertencentes à
relembrada Maçonaria (nas suas diversas obediências, tendências, Lojas e
preponderantes filiações ideológicas e político-partidárias, com destaque aqui,
como é sabido, para ilustres dirigentes históricos do PS e do PSD)
, a par, naturalmente,
do facto de tal tema ser apaixonante, revestindo-se de inusitados alcances,
directos e indirectos, para o estudo da
História e das Mentalidades.

– Todavia e em todo o caso não
poderá deixar de tornar a constatar-se que na Maçonaria, como em todas as
instituições, haverá realmente gente de bem, mérito e genuína valia (a quem
Portugal e os Açores muito deveram e devem)
, a
par de outros – como hoje é mais do que evidente
continuar a poder ser constatado! –, cuja errática e oportunista carreira,
mediocridade intolerante e pérfidas jogatinas de poder e fortuna interligados
são o próprio
contra-testemunho contínuo
de
quaisquer apregoados ideais fraternos e
humanistas (ou assim
pretensamente
assumidos como tal), nas cabeças trianguladas e nas pedreiras brutas daquelas
lojas e lojecas estratégicas, por entre muita
tanga a servir de
avental...
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NOTAS:
– “CERIMÓNIA MACÓNICA NA BASILICA DA ESTRELA: O
presidente do Tribunal Constitucional, Luís Nunes de Almeida, que morreu
segunda-feira vítima de ataque cardíaco, em Espanha, recebeu ontem exéquias
maçónicas na Basílica da Estrela. O caso não é inédito, mas desde a morte do
antigo primeiro-ministro da monarquia, António Rodrigues Sampaio, em 1882, que
não se realizava uma cerimónia deste género num templo da Igreja Católica.
Surgiram surpresas e até protestos junto do Patriarcado, mas o grão-mestre do
Grande Oriente Lusitano (GOL), António Arnaut, desdramatizou: «A Maçonaria não
tem hoje nenhum conflito com a Igreja Católica.» E mais: «Tratou-se de uma
cerimónia sagrada, num local sagrado, da homenagem de homens bons a outro homem
bom», frisou ao DN. Mas o
grão-mestre também não nega os factos históricos e fala das incompatibilidades
com a Igreja, com o Estado e com a monarquia. Mas isso são tempos que já lá
vão: «Hoje não temos conflitos com ninguém, trabalhamos em paz.» De resto, fez
questão de explicar que a homenagem do GOL (a maior obediência maçónica em
Portugal) a Luís Nunes de Almeida se realizou no respeito pela vontade expressa
em vida pelo presidente do TC – um dia quando morresse queria ficar em câmara
ardente no palácio maçónico, ao Bairro Alto, em Lisboa. Acontece que Luís Nunes
de Almeida era o presidente do TC em exercício, logo a quarta figura do Estado.
E o seu funeral também exige honras formais. A Maçonaria, a Presidência da República
e a família consideraram então que se o corpo ficasse em câmara ardente na
Basílica da Estrela seria possível a prestação das honras de Estado e a
homenagem maçónica”.

– “O grão-mestre do Grande Oriente Lusitano (GOL) refutou
ontem as críticas do cardeal-patriarca de Lisboa à Maçonaria, relacionando a
iniciativa de D. José Policarpo com o actual ambiente na Igreja Católica em
torno da sucessão do Papa. Em nota pastoral sobre a Quaresma, divulgada
sexta-feira, D. Policarpo reafirmou a posição tradicional do Vaticano sobre a
Maçonaria, dizendo que "um católico, consciente da sua fé e que celebra a
eucaristia, não pode ser mação". Interpelado ontem pela Lusa, o
grão-mestre do GOL, António Arnaut, recordou um português, membro da Igreja de
Roma, frei Francisco Saraiva, que foi no século XIX cardeal de Lisboa, entre
1840 e 1845, "depois de ter sido grão-mestre da Maçonaria do Sul", em
1837, integrada depois no GOL. Na nota pastoral, D. José Policarpo explicou que
a referência à Maçonaria está relacionada com o ritual maçónico efectuado em
Setembro de 2004, na capela mortuária da Basílica da Estrela, em Lisboa, antes
do funeral do ex-presidente do Tribunal Constitucional (TC), Luís Nunes de
Almeida. "Esta iniciativa, que considero imprudente e indevida, provocou
indignação em muitos católicos, que incessantemente têm pedido esclarecimentos
da hierarquia da Igreja", segundo o cardeal-patriarca. António Arnaut,
grão-mestre do GOL e fundador do PS, disse ontem compreender as afirmações de
D. José Policarpo "pela necessidade de dar uma explicação aos católicos
conservadores, que não compreendem o sentido espiritual das exéquias fúnebres
do mação Luís Nunes de Almeida". Arnaut associou também a iniciativa do
prelado ao "momento especial que se vive no Vaticano", com a doença
do Papa João Paulo II e as movimentações para a sua eventual sucessão”.